sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Do luto à luta

Psicologia

RELACIONAMENTOS – Do luto à luta

by psicomarcosmarinho
publicado em recortes por
Do Site Obvious
Superar uma perda, significa muito mais do que ignorá-la ou passar a ocupar a mente com outras questões que implicam a vida. Transcender o luto, está mais relacionado a internalizar os aprendizados e encontrar sentido para o que se teve oportunidade de viver, pois jamais se pode tirar o que é incorporado à essência... À aquilo que, ao experimentado, passou a dar significado ao nosso ser.
Não há despertar da consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando ao limite do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Mas, ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim ao se conscientizar da escuridão.” (Carl Jung).
Desde o início da vida de uma criança, a negligência em questões relacionadas à perda (morte, derrota, mudança etc.), acontece de forma que, algo tão natural como a morte (devido à sua inevitabilidade), por exemplo, acaba se tornando um obstáculo quase sempre “mal superado”, podendo gerar deformações psíquicas no decorrer das idades.
O próprio fato de fazer algumas escolhas, muitas vezes acarreta em abrir mão de outras e, no caso, se em algum momento não lidei de maneira efetiva com minhas “perdas”, ou seja, se meus lutos não foram bem trabalhados e tratados, naturalmente que isso influenciará e muito no que se refere às escolhas em relação ao “o que” terei de abrir mão para seguir em frente.
Observei alguns casos de pessoas que permaneciam estagnadas em suas vidas quando tinham a oportunidade de serem melhores (em relação a elas próprias) e desenvolverem seus potencias, acreditando que aquelas eram suas escolhas quando, após algum tempo, se deram conta que na verdade, permaneciam ali por medo do desconhecido ou por apego à zona de conforto.
Por não se atentarem a essa condição natural da vida (desapego) é comum observarmos pessoas que não conseguem transcender em suas próprias vidas, permanecendo atrelados a trabalhos que não gostam; relacionamentos esgotados; estagnação em relação ao próprio potencial pessoal ou mesmo no que se refere à qualidade de vida.
É importante atentarmos à palavra DESENVOLVIMENTO: quando procuramos no dicionário, normalmente poderemos encontrar significados relacionados a “progresso”, “crescimento” etc.. Gosto de analisar essa palavra com um crivo mais psicanalítico quando parto para a perspectiva que, para poder me envolver de forma íntegra com o hoje, é necessário me “des” envolver com o ontem.
Observe que o desenvolvimento, nesse caso, tem a ver também com a maneira como nos desapegamos das coisas das pessoas e até mesmo das nossas memórias. Não significa que devemos ignorar ou esquecer, mas, mais profundo que isso, é internalizar o sentido ou significado da relação tornando-o parte de nós mesmos e não mais “separado” de nós.
Nos relacionamentos amorosos isso se elucida de forma clara quando pensamos que é necessário romper a relação com uma pessoa para iniciar uma com outra. Acredito que o que torna bonita a nossa passagem pela vida é essa realidade que pouco queremos aceitar, mas, quando nos damos conta efetivamente dela (perda), podemos passar a vivenciar as oportunidades com mais intensidade e, por conseguinte, vivermos de forma mais profunda e conectadas com os momentos que nos são concebidos.
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O ESTUDO DA MORTE
O homem possui uma extrema capacidade de adaptação, haja vista que a seleção natural refere-se a essa habilidade (presente em todas as diferentes formas de vida), como a tônica, no que diz respeito à sobrevivência de qualquer espécie. Assim sendo, lidar com a “perda da referência”, passa a ser um atributo da sobrevivência e continuidade.
Na TANATOLOGIA (parte da medicina legal que se ocupa da morte e dos problemas médico-legais com ela relacionados), esse processo (luto) não se restringe apenas à presença da morte. Ele também está presente em toda privação, nas rupturas matrimoniais, nos rompimentos com amigos e até mesmo a uma mudança de ambiente. Assim, este sentimento pode ser concebido, na verdade, como um mecanismo inerente à psique humana.
A resiliência (conceito psicológico emprestado da química, definido como a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas – choque, estresse etc. – sem entrar em surto psicológico.), é o estado chave para passar por esse processo (luto).
A American Psychological Association define resiliência como o “processo e resultado de se adaptar com sucesso a experiências de vida difíceis ou desafiadoras, especialmente através da flexibilidade mental, emocional e comportamental e ajustamento às demandas externas e internas”.
O estudo da TANATOLOGIA em psicologia diz que independente da perda, o indivíduo sempre passa pelas mesmas fases, que são cinco, as quais não necessariamente são sequenciais, podendo se revelar, ao mesmo tempo, dependendo de cada pessoa:
1. NEGAÇÃO: o indivíduo permanece anestesiado; há o surgimento da descrença. Nessa fase a pessoa nega a existência do problema ou situação. Pode não acreditar na informação que está recebendo, tentar esquecê-la, não pensar nela ou ainda buscar provas ou argumentos de que ela não é a realidade. Comportamentos comuns: Buscar uma segunda opinião ou outras explicações para a questão; Continuar se comportando como antes (ignorando a situação); Não aderir ao tratamento (no caso de doença) ou não falar sobre o assunto (no caso de morte, desemprego ou traição).
2. RAIVA: nessa fase a pessoa expressa raiva por aquilo que ocorre. É comum o aparecimento de emoções como revolta e ressentimento. Geralmente essas emoções são projetadas no ambiente externo; percebendo o mundo, os outros, Deus, etc. como causadores de seu sofrimento. A pessoa sente-se inconformada e vê a situação como uma injustiça. Comportamentos comuns: perde a calma quando fala sobre o assunto; recusa-se a ouvir conselhos; não quer falar sobre o assunto.
3. NEGOCIAÇÃO: nessa fase busca-se fazer algum tipo de acordo de maneira que as coisas possam voltar a ser como antes. Essa negociação geralmente acontece dentro do próprio indivíduo ou às vezes voltada para a religiosidade. Promessas, pactos e outros similares são muito comuns e muitas vezes ocorrem em segredo. Comportamentos comuns: rezar, fazer um acordo com Deus; buscar agradar (no caso de relacionamento); alimentar-se com produtos “lights” e diets para compensar os outros alimentos.
4. DEPRESSÃO: nessa fase ocorre um sofrimento profundo. Tristeza, desolamento, culpa, desesperança e medo são emoções bastante comuns. É um momento em que ocorre uma grande introspecção e necessidade de isolamento. Comportamentos comuns: chorar, afastar-se das pessoas; comportamentos autodestrutivos.
5. ACEITAÇÃO: Nessa fase percebe-se e vivencia-se uma aceitação do rumo das coisas. As emoções não estão mais tão à flor da pele e a pessoa se prontifica a enfrentar a situação com consciência das suas possibilidades e limitações. Comportamentos comuns: buscar ajuda para resolver a situação; conversar com outros sobre o assunto; planejar estratégias para lidar com a questão.
Esses estados variam em se tratando de tempo para cada pessoa e mediante a intensidade de cada situação. As pessoas não passam por essas fases de maneira linear, ou seja, elas podem superar uma fase, mas depois retornar a ela (ir e vir), estacionar em uma delas, sem ter avanços por longo período ou ainda suplantar todas as fases rapidamente até a aceitação. Não há regra. Tudo depende do histórico de experiências da pessoa e crenças que ela tem sobre si mesma e sobre a situação em questão.
A vida se resume a uma simples escolha: ocupar-se de viver ou ocupar-se de morrer” (William Shakespeare).
Partindo dessa premissa, podemos sim encurtar o percurso nessa “curva”, ao passo que, quando optamos por viver, naturalmente podemos acelerar o processo seguindo direto, da negação para a aceitação. Quando não nos damos conta desse procedimento natural, muitas vezes deixamos de viver o luto, negligenciando o processo ou fugindo dele.
Para elucidar, posso usar como exemplo o caso de um término abrupto de relacionamento mediante a traição: o individuo traído, pode escolher substituir a relação por outra e acreditar que superou o trauma anterior. O que ocorre é apenas a soma dos estados ao passo que, em qualquer outra situação de término, surgirá pensamentos como “tenho que ficar sozinho mesmo”, “ninguém presta” etc. ou mesmo a negação em se lançar para uma nova relação, usando a prudência como máscara para o medo oculto oriundo do trauma que não foi tratado.
Outra questão que pode surgir nascida dessa negligência é, levando em conta a capacidade humana de adaptação, em dado momento em que o indivíduo é revigorado pelo externo (atenção de outros, bajulação, cuidados excessivos etc.). Isso pode, necessariamente, se tornar um reforçador de comportamento corroborando para que se mantenha naquela condição e, sem que se dê conta, acaba perdendo a referência do seu próprio estado de equilíbrio, visto que o estado emocionalmente miserável que está vivendo, passa a ser a nova referência devido ao tempo e permanência mediante aos estímulos reforçadores as quais o sujeito é exposto.
É como aquela menina que põe uma foto de biquíni na internet e recebe atenção; outra que põe uma “frase de efeito” ou outra que se lamenta e é reforçada. Esse reforço, seja lá como se revelar, será, em grande parte, responsável pela permanência do indivíduo naquele estado junto aos comportamentos específicos.
Caberia ao indivíduo, trazer novamente as referencias positivas passadas para poder gerar uma equivalência entre os estados, acessar a sinestesia e, através da subjetividade, encontrar o estado emocional sumário já vivido, mas que, por questão de sobrevivência do organismo (cérebro primitivo), foi colocado em segundo plano (o organismo tende a se adaptar ao estado atual).
Caso aconteça com alguém próximo (o que normalmente acontece), é preciso estar atento aos reforçadores de comportamento, ajudando o sujeito a encontrar sentido e evitar reforçar o estado miserável, ao contrário, orientar o próprio a encontrar novas referências e caminhos assim como lançar-se a analise sobre os aprendizados oriundos daquela relação perdida.
A incorporação das experiências e aprendizados corrobora para o equilíbrio no momento em que o sujeito se dá conta que “o outro” não está necessariamente fora dele, mas sim, incorporado através das experiências adquiridas no processo em que se deu a relação.
A dor é suportável quando conseguimos acreditar que ela terá um fim e não quando fingimos que ela não existe.” (Allá Bozarth-Campbell).
psicomarcosmarinho | 20/02/2015 às 15:39 | Tags: luto, morte, psicoterapia | Categorias: ajuda psicológica, luto | URL: http://wp.me/p2NsmY-og
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