sábado, 4 de abril de 2015

A corrupção na ditadura militar

A ditadura civil-militar foi o regime mais corrupto da história brasileira

Ditadura_Militar36_Corrupcao
A corrupção na ditadura militar
Via Falando Verdades e lido em O Cafezinho
Depois de muitas pesquisas, procura de arquivos, eis que nos deparamos com farto material que mostra a corrupção escancarada na ditadura militar que tem em seu círculo até hoje defensores falso moralistas elitizados que falam em nome de minorias, vamos então abordar o tema.
Moralismo capenga
O combate à corrupção foi palavra de ordem durante a ditadura. Nos porões do regime, porém, a ilegalidade prevaleceu.
Heloisa Maria Murgel Starling
Combater a corrupção e derrotar o comunismo: esses eram os principais objetivos que fermentavam os discursos nos quartéis, às vésperas do golpe que derrubou o governo João Goulart, em março de 1964. A noção de corrupção dos militares sempre esteve identificada com uma desonestidade específica: o mau trato do dinheiro público. Reduzia-se a furto. Na perspectiva da caserna, corrupção era resultado dos vícios produzidos por uma vida política de baixa qualidade moral e vinha associada, às vésperas do golpe, ao comportamento viciado dos políticos diretamente vinculados ao regime nacional-desenvolvimentista.
Animado por essa lógica, tão logo iniciou seu governo, o marechal Castello Branco (1964-1967) prometeu dar ampla divulgação às provas de corrupção do regime anterior por meio de um livro branco da corrupção – promessa nunca cumprida, certamente porque seria preciso admitir o envolvimento de militares nos episódios relatados. Desde o início o regime militar fracassou no combate à corrupção, o que se deve em grande parte a uma visão estritamente moral da corrupção.
Essa redução do político ao que ele não é – a moral individual, a alternativa salvacionista – definiu o desastre da estratégia de combate à corrupção do regime militar brasileiro, ao mesmo tempo em que determinou o comportamento público de boa parte de seus principais líderes, preocupados em valorizar ao extremo algo chamado de decência pessoal.
Os resultados da moralidade privada dos generais foram insignificantes para a vida pública do país. O regime militar conviveu tanto com os corruptos, e com sua disposição de fazer parte do governo, quanto com a face mais exibida da corrupção, que compôs a lista dos grandes escândalos de ladroagem da ditadura. Entre muitos outros estão a operação Capemi (Caixa de Pecúlio dos Militares), que ganhou concorrência suspeita para a exploração de madeira no Pará, e os desvios de verba na construção da ponte Rio–Niterói e da Rodovia Transamazônica. Castello Branco descobriu depressa que esconjurar a corrupção era fácil; prender corrupto era outra conversa: “O problema mais grave do Brasil não é a subversão. É a corrupção, muito mais difícil de caracterizar, punir e erradicar.”
A declaração de Castello foi feita meses depois de iniciados os trabalhos da Comissão Geral de Investigações. Projetada logo após o golpe, a CGI conduzia os Inquéritos Policiais-Militares que deveriam identificar o envolvimento dos acusados em atividades de subversão da ordem ou de corrupção. Com jurisdição em todo o território nacional, seus processos obedeciam a rito sumário e seus membros eram recrutados entre os oficiais radicais da Marinha e da Aeronáutica que buscavam utilizar a CGI para construir uma base de poder própria e paralela à Presidência da República.
O Ato Institucional nº 5, editado em 13 de dezembro de 1968, deu início ao período mais violento e repressivo do regime ditatorial brasileiro – e, de quebra, ampliou o alcance dos mecanismos instituídos pelos militares para defender a moralidade pública. Uma nova CGI foi gerada no âmbito do Ministério da Justiça com a tarefa de realizar investigações e abrir inquéritos para fazer cumprir o estabelecido pelo Artigo 8º. do AI-5, em que o presidente da República passava a poder confiscar bens de “todos quantos tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública”.
Para agir contra a corrupção e dar conta da moralidade pública, os militares trabalharam tanto com a natureza ditatorial do regime como com a vantagem fornecida pela legislação punitiva. Deu em nada. Desde 1968 até 1978, quando foi extinta pelo general Geisel, a CGI mancou das duas pernas. Seus integrantes alimentaram a arrogante certeza de que podiam impedir qualquer forma de rapinagem do dinheiro público, através da mera intimidação, convocando os cidadãos tidos como larápios potenciais para esclarecimentos.
A CGI atribuiu-se ainda a megalomaníaca tarefa de transformar o combate à corrupção numa rede nacional, atuando ao mesmo tempo como um tribunal administrativo especial e como uma agência de investigação e informação. Acabou submergindo na própria mediocridade, enredada em uma área de atuação muito ampla que incluía investigar, por exemplo, o atraso dos salários das professoras municipais de São José do Mipibu, no Rio Grande do Norte; a compra de adubo superfaturado pela Secretaria de Agricultura de Minas Gerais e as acusações de irregularidades na Federação Baiana de Futebol. Entre 1968 e 1973 os integrantes da comissão produziram cerca de 1.153 processos. Desse conjunto, mil foram arquivados; 58 transformados em propostas de confisco de bens por enriquecimento ilícito, e 41 foram alvo de decreto presidencial.
Mas o fracasso do combate à corrupção não deve ser creditado exclusivamente aos desacertos da Comissão Geral de Investigações ou à recusa de membros da nova ordem política em pagar o preço da moralidade pública. A corrupção não poupou a ditadura militar brasileira porque estava representada na própria natureza desse regime. Estava inscrita em sua estrutura de poder e no princípio de funcionamento de seu governo. Numa ditadura onde a lei degradou em arbítrio e o corpo político foi esvaziado de seu significado público, não cabia regra capaz de impedir a desmedida: havia privilégios, apropriação privada do que seria o bem público, impunidade e excessos.
A corrupção se inscreve na natureza do regime militar também na sua associação com a tortura – o máximo de corrupção de nossa natureza humana. A prática da tortura política não foi fruto das ações incidentais de personalidades desequilibradas, e nessa constatação reside o escândalo e a dor. A existência da tortura não surgiu na história desse regime nem como algo que escapou ao controle, nem como efeito não controlado de uma guerra que se desenrolou apenas nos porões da ditadura, em momentos restritos.
Ao se materializar sob a forma de política de Estado durante a ditadura, em especial entre 1969 e 1977, a tortura se tornou inseparável da corrupção. Uma se sustentava na outra. O regime militar elevou o torturador à condição de intocável: promoções convencionais, gratificações salariais e até recompensa pública foram garantidas aos integrantes do aparelho de repressão política. Caso exemplar: a concessão da Medalha do Pacificador ao delegado Sérgio Paranhos Fleury (1933-1979).
A corrupção garantiu a passagem da tortura quando esta precisou transbordar para outras áreas da atividade pública, de modo a obter cumplicidade e legitimar seus resultados. Para a tortura funcionar é preciso que na máquina judiciária existam aqueles que reconheçam como legais e verossímeis processos absurdos, confissões renegadas, laudos periciais mentirosos. Também é necessário encontrar gente disposta a fraudar autópsias, autos de corpo de delito e a receber presos marcados pela violência física. É preciso, ainda, descobrir empresários dispostos a fornecer dotações extra-orçamentárias para que a máquina de repressão política funcione com maior precisão e eficácia.
A corrupção quebra o princípio da confiança, o elo que permite ao cidadão se associar para interferir na vida de seu país, e ainda degrada o sentido do público. Por conta disso, nas ditaduras, a corrupção tem funcionalidade: serve para garantir a dissipação da vida pública. Nas democracias – e diante da República – seu efeito é outro: serve para dissolver os princípios políticos que sustentam as condições para o exercício da virtude do cidadão. O regime militar brasileiro fracassou no combate à corrupção por uma razão simples – só há um remédio contra a corrupção: mais democracia.
Heloisa Maria Murgel Starling é professora de História da Universidade Federal de Minas Gerais e coautora de Corrupção: ensaios e críticas (Editora da UFMG, 2008).
***
Leia também:
50 anos do golpe: Repressão e tortura
50 anos do golpe: A preparação
50 anos do golpe: Uma entrevista com Sílvio Tendler
No tempo da ditadura
50 anos do golpe: Dilma não vai aceitar celebrações militares
50 anos do golpe: N0s idos de cinquenta marços
Empresários que apoiaram o golpe de 64 construíram grandes fortunas
50 anos do golpe: A verdade e a impunidade
A operação de guerra que garantiu a posse de Jango com o parlamentarismo
Por que algumas pessoas têm saudade dos tempos dos militares?
“Ditadura selou aliança entre latifúndio e burguesia industrial”, afirma professora
A mídia e o golpe de 1964
A farsa desfeita: A “revolução” de 64 foi uma quartelada
O organizador da Marcha da Família é uma ameaça à sociedade
Breno Altman: A presidenta falará esta noite?
Antonio Lassance: A ditadura e seus psicopatas de ontem e de hoje
Há 50 anos, elite empresarial que queria derrubar Jango financiou a marcha
Dez motivos para não ter saudades da ditadura
Os patetas patéticos da “Marcha dos Sem Gente”
Câmara abre espaço para golpistas e saudosos da ditadura
Militar-torturador diz que arrancava dedos, dentes e vísceras de preso morto
Filho de Jango quer saber: Como os EUA participaram do golpe
A marcha da família e o mundo igualitário com Ferrari
Bob Fernandes: “Marcha da Família Alienada” é uma ópera bufa
Lalo Leal Filho: O Brasil da mídia e o país real
Vergonha ou medo?: Comandantes evitam lembrar à tropa aniversário do golpe de 64
50 anos do golpe: Ditadura militar, a raiz da impunidade no Brasil
General Newton Cruz diz que não pode ser punido pelo caso Riocentro
50 anos do golpe: Uma visita ao DOI-Codi, centro do terror nos anos de chumbo
50 anos do golpe: Como algumas empresas se beneficiaram com a ditadura militar
50 anos do golpe: A nova marcha e a nova farsa
Mauro Santayana: Reflexões sobre um golpe em nossa história
E se o Exército fosse dissolvido?
Wanderley Guilherme dos Santos: Um comício da Central do Brasil no Legislativo
Antonio Lassance: Sete lições sobre o golpe de 1964 e sua ditadura
Viúvas da ditadura tentam reeditar Marcha da Família
“Golpe militar 2014” expõe ultra direita ao ridículo no Brasil
Chico Xavier e a ditadura militar
O golpe de 1964 em filmes, livros e artigos
A imprensa brasileira e o golpe de 1964I
Em 1964, a ditadura também veio em nome da ordem e da liberdade
Golpe: Os 50 anos da campanha “Ouro para o bem do Brasil”
MPF denuncia coronel Ustra por ocultação de cadáver na ditadura militar
Ditadura militar: O algoz e o crematório
“Coronel Ustra comandava a tortura”, diz ex-sargento
Marco Aurélio Mello: Ministro que defende o golpe de 1964 pode ter lisura para julgar a AP470?
Mauro Santayana: O golpe da informação
Apoio da Globo ao golpe de 1964 foi comercial, não ideológico
O PIG apoiou a ditadura militar: As manchetes do golpe de 1964
31 de março é um dia para lamentar
A Globo e a ditadura militar, segundo Walter Clark
Golpe de 1964: A Globo devolverá o dinheiro que ganhou com ele?
Tucanou o golpe: Aécio Neves chama ditadura de “revolução”
Golpe de 1964: Ranieri Mazzilli, o político Modess
Dom Eugênio Sales era o cardial da ditadura
“Memórias da Resistência”: Novo documentário sobre a ditadura militar
Nelson Rodrigues tinha um pé na ditadura militar
Músicas de Chico Buarque ajudam a estudar o período da ditadura
Maria Rita Kehl: Alckmin usou a mesma retórica dos matadores da ditadura
Paulo Moreira Leite: A ditadura gostava de criminalizar a política
Paulo Moreira Leite: A ditadura militar e a AP 470
Ditadura militar: Os delatores de Dilma
Relações da mídia com a ditadura: Um histórico debate na Falha de S.Paulo
Uma foto da ditadura que o Brasil não viu
Mídia e ditadura: A primeira morte de Jango
O elo da Fiesp com os porões da ditadura
Depoimentos de ex-militares reforçam sadismo de torturadores na ditadura
Livro expõe ligação de agências de propaganda com ditadura militar
Folha financiava a ditadura e Frias, amigo pessoal de Fleury, visitava o Dops, diz ex-delegado
Vereador Nabil Bonduki quer mudar nomes de ruas de São Paulo que homenageiam ditadura
Trairagem: Aloizio Mercadante bajula Folha e esbofeteia vítimas da ditadura
Deputado acusa Rede Globo de prestar serviços à ditadura
Pesquisa sinistra do Datafolha testa popularidade da volta da ditadura
Ditadura militar: Estadão apoiou atos do torturador Ustra
Comissão da Verdade vai ter de enfrentar assassinos da ditadura
Marilena Chauí: A ditadura militar iniciou a devastação da escola pública
Dá pra confiar num cara desses? Delfim Netto afirma que não sabia de tortura na ditadura
Da ditadura militar ao Facebook: Uma breve história do Brasil
Ditadura militar: Documentos revelam conexão entre Itamaraty e Operação Condor
Ditadura militar: Procurador-geral da República diz que tortura e morte são imprescritíveis
Emir Sader: Os cúmplices da ditadura
Como era a propaganda da ditadura militar na Rede Globo
Mauricio Dias: Os fantasmas da ditadura
Segundo pesquisa, os milicanalhas da ditadura torturavam desde os primeiros dias no poder
Vídeo: Em depoimento emocionante, Dilma Rousseff fala sobre a ditadura militar e a tortura
Prefeitura de São Paulo, “que participou da ditadura”, terá comissão da verdade
Ditadura militar: “Imprensa aceitou a censura”, diz historiadora
Os filhos de 1964: Memórias e exumações
Em 1964, os militares golpistas venderam a democracia
Vídeo: 1964 – Um golpe contra o Brasil
Gilson Caroni Filho: 1964, a atualização grotesca de nossos liberais
Filme revela como EUA deram o golpe de 1964
Documentário quer explicar aos jovens as origens do golpe de 1964
Luis Nassif: Um estudo clássico sobre 1964
Saudades de 1964
Hildegard Angel: “É meu dever dizer aos jovens o que é um golpe de estado.”
Hildegard Angel: É meu dever dizer aos jovens o que é um golpe de estado
Hildegard Angel: A sombra do golpe de 64 paira sobre nossas cabeças
A Igreja Católica e o golpe militar no Brasil
O golpe militar no Brasil está marcado para 31 de março de 2014
Além de Aécio, Folha também costumava chamar golpe de revolução
“Igrejas legitimaram golpe militar”, afirma pesquisador
O cordão da ditabranda cada vez aumenta mais
Folha: Da ditabranda às Diretas Já
Ditadura militar: Coronel do Exército confirma farsa montada no desaparecimento de Rubens Paiva
Documentos do Exército revela os dedos-duros do meio artístico na ditadura militar
Leandro Fortes: As almas penadas da ditadura
Saiba quem são os nazifascistas do grupo Revoltados On-line
Revoltados On-line: Agora, Hélio Bicudo se junta à extrema-direita

7 Respostas to “A ditadura civil-militar foi o regime mais corrupto da história brasileira”

  1. A ditadura civil-militar foi o regime mais corr... Says:
    […] A corrupção na ditadura militar Via Falando Verdades e lido em O Cafezinho Depois de muitas pesquisas, procura de arquivos, eis que nos deparamos com farto material que mostra a corrupção escancara…  […]
  2. A ditadura civil-militar foi o regime mais corrupto da história brasileira | O LADO ESCURO DA LUA Says:
    […] See on Scoop.it – BOCA NO TROMBONE!A corrupção na ditadura militar Via Falando Verdades e lido em O Cafezinho Depois de muitas pesquisas, procura de arquivos, eis que nos deparamos com farto material que mostra a corrupção escancara…See on limpinhoecheiroso.com […]
  3. A ditadura civil-militar foi o regime mais corrupto da história brasileira | EVS NOTÍCIAS. Says:
    […] See on limpinhoecheiroso.com […]
  4. A corrupção na ditadura militar | Blog do Robert Lobato Says:
    […] Via Limpinho e Cheiroso […]
  5. Newton Rodrigues De Farias Filho Says:
    Dizem que tudo começou com o PT. As punições sim…
  6. PAULO RICARDO SILVEIRA Says:
    PERFEITO, NADA A INCLUIR, DISSE-O TUDO !
  7. Eduardo Ferreira Braga Says:
    Poucos avanços e benefícios tivemos, como ‘frutos’ da Ditadura Militar em nosso país!… A meu ver, nossa sociedade e nossa política só pioraram! Houve, sim, uma grande decepção, os cidadãos perderam o respeito próprio e às instituições que, em vez de se fortalecerem foram se deteriorando!… Muito do que vemos hoje em dia, em termos de violência, desrespeito cívico e às lideranças políticas, desamor à pátria e ao povo, deterioração gradativa da educação escolar e familiar, entre outras mazelas, são na realidade um ‘legado’ da ‘nossa’ ditadura, que muitíssimo beneficiou, deu poder irrestrito e enriqueceu poucos, ainda hoje mandatários e os reais ‘dirigentes’ da nossa nação, da política, da economia e da grande mídia de direita extrema (essa ‘mídia’, o mais terrível dos males, patrocinado e fortalecido pelos militares!). Penso que os militares foram enganados e usados nesse ‘projeto’ maldito, mentiroso e sujo, arquitetado, desde a segunda era Vargas, pelos países imperialistas do bloco ocidental, durante a Guerra Fria, apoiados daqui pelos empresários, pela elite fascista e pela mídia vendida, todos traidores e golpistas! Após tudo isso, depois de 21 anos, com a famigerada Lei da Anistia e o perdão completo a todos esses traidores da pátria, foi instaurada, a partir de então em nosso país, a impunidade absoluta e o desrespeito aos valores mais básicos!

Brasil no PORTÃO DO INFERNO!!

Levaram o Brasil ao PORTÃO DO INFERNO Por Professor Negreiros 18 de março de 2024 Desde a segunda campanha eleitoral de Dilma Rousseff rumo ...