sexta-feira, 18 de setembro de 2015

vergonhosa aliança entre a Justiça e a mídia

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sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Paulo Nogueira: A vergonhosa aliança entre a Justiça e a mídia.

Postado em 18 set 2015
Um retrato da indecência
Um retrato da indecência
Esta foto é um retrato da indecência.
Nela, Gilmar Mendes e Merval Pereira aparecem numa alegre confraternização que é um pesadelo para a sociedade.
Era o lançamento de um livro de Merval. Não um livro original, mas uma compilação de artigos seus sobre o Mensalão.
Numa sociedade avançada, e o Brasil aspira a ser uma delas, a imprensa e a Justiça se autofiscalizam.
Uma deve coibir excessos da outra.
Quando esses dois poderes se abraçam, como ilustra à perfeição a foto de Gilmar e Merval, perdemos todos nós.
“Jornalista não tem amigo”. Esta é uma frase clássica de um dos maiores editores da história do jornalismo.

Em meus dias de editor, tinha esta frase pregada no mural de minha sala. Repetia-a com frequência aos repórteres, passíveis de se deslumbrar com as potenciais amizades que o jornalismo lhes traz.
A lógica de Pulitzer, expressa há mais de um século, é eterna.
Um jornalista não cobre devidamente um amigo. Fecha os olhos para certas coisas e enaltece qualquer bobagem.
Merval é o anti-Pulitzer.
O mesmo ensinamento pulitzeriano se aplica integralmente à Justiça.
Um juiz não pode ter amigos.
Claro que não estou falando dos amigos do bairro, do clube, da padaria ou até do lupanar.
Falo dos amigos do âmbito profissional.
Como Gilmar, para ficar neste caso, poderia julgar uma causa na qual Merval estivesse porventura envolvido?
É por isso que é simplesmente abjeto juízes aceitarem premiações de empresas jornalísticas. Isso cria um laço, uma cumplicidade danosa à sociedade. Aos cidadãos. A nós, enfim.
A Globo premiou, nos últimos anos, Joaquim Barbosa e Sérgio Moro.
O decoro deveria tê-los impedido de aceitar. Mas, ao contrário, o que vimos foi a felicidade rutilante de ambos ao lado dos Marinhos.
Por que eles estavam sendo premiados? Porque, cada qual a seu jeito, os dois lideraram movimentos visceralmente antipetistas, o Mensalão e a Lava Jato.
Não foi pelo talento, pela inovação, pela transformação que Barbosa ou Moro trouxeram ao enferrujado, patético sistema jurídico nacional.
Gilmar é o símbolo supremo desse sistema.
Ele não pratica justiça, e sim política. Vale-se para isso do posto privilegiado  que FHC lhe garantiu no STF.
Seria digno ele sair desse pedestal que lhe foi dado em troca de defender as causas de FHC e se submetesse às urnas.
Mas é querer demais de quem posa, alegremente, ao lado de jornalistas.
Luciana Genro defendeu, em 2008, o impeachment de Gilmar, mas ficou numa luta solitária e vã.
O assunto deveria ser retomado agora.
Não é possível que a sociedade seja obrigada a tolerar, por anos intermináveis, um juiz que faz política.
(Acompanhe as publicações do DCM no Facebook. Curta aqui).
Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

morte da democracia e a farsa neoliberal

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sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Andrea Fumagalli: A morte da democracia e a farsa neoliberal da neutralidade da moeda.

Entrevista especial com Andrea Fumagalli

UNISINOS - Sexta, 18 de setembro de 2015
Quando “hierarquias do mercado ditarem escolhas da política econômica e o próprio mercado estabelecer as regras das relações humano-sociais, a democracia, entendida como processo de decisão resultante de um princípio dialético, está morta”, adverte economista italiano
Foto: direitoagesn.blogspot.com
“O pensamento neoliberal fundamenta-se no conceito de neutralidade da moeda e na suposição da perfeita competição nos mercados financeiros. Na verdade, os mercados financeiros não são imparciais e neutros, mas expressão de uma hierarquia bem precisa: longe de serem concorrenciais, escondem uma pirâmide que vê, na parte superior, poucosoperadores financeiros controlando mais de 65% de fluxos globais e, na base, uma miríade de pequenos investidores e operadores desempenhando uma função passiva. Tal estrutura permite que poucas empresas tenham capacidade de atingir e afetar a dinâmica do mercado. Asagências de rating (amiúde em conluio com as financeiras) ratificam, de modo instrumental, decisões oligárquicas, tomadas de tempos em tempos. Com tal farsa, o pensamento neoliberal tenta fazer passar como objetiva, neutra e naturalmente dada, uma estrutura de poder que, ao contrário, objetiva favorecer uma distribuição que vai dos mais pobres para os mais ricos”. A reflexão é do economista italiano Andrea Fumagalli, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. E acrescenta: “A democracia está morta exatamente no momento que tem início a parábola do capitalismo cognitivo”.
Andrea Fumagalli (foto abaixo) é Doutor em Economia Política, professor no Departamento de Economia Política e Método Quantitativo da Faculdade de Economia e Comércio da Università di Pavia, Itália. Seus temas de interesse são teoria macroeconômica, teoria do circuito monetário; economia da inovação e da indústria, flexibilidade do mercado de trabalho e mutação do capitalismo contemporâneo: o paradigma do capitalismo cognitivo, entre outros.

Dentre seus vários livros publicados, citamos: Il lavoro. Nuovo e vecchio sfruttamento (Milão: Punto Rosso, 2006),Bioeconomia e capitalismo cognitivo. Verso un nuovo paradigma di accumulazione (Roma: Carocci Editore, 2007) eLa crisi economica globale (Verona: Ombre corte, 2009).
Em 2010 Fumagalli participou com uma conferência do XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana, quando falou sobre A financeirização como forma de biopoder.
Confira a entrevista.
Foto: wikimedia.org
IHU On-Line - O que une bioeconomia e capitalismo cognitivo?
Andrea Fumagalli - O atual paradigma de acumulação chama-se "capitalismo cognitivo". Conforme Carlo Vercellone, "o termo capitalismodesigna aquelas variáveis fundamentais do sistema capitalista que permanecem, mesmo transformando-se: em particular, a preponderância do lucro e da relação salarial ou, mais precisamente, as diferentes formas de trabalho dependente, dais quais se extrai a mais-valia; o atributo cognitivo evidencia a nova natureza do trabalho, as fontes de valorização e a estrutura da propriedade, sobre as quais se funda o processo de acumulação e das contradições que esta mutação gera".
centralidade das economias de aprendizagem e do trabalho em rede, típicas do capitalismo cognitivo, vai sendo questionada no início do novo milênio, na sequência do rebentamento da bolha especulativa da Net-Economy, em março de 2000. O novo paradigma cognitivo não é capaz de evitar sozinho a instabilidade do sistema socioeconômico que o caracteriza. É necessário injetar nova liquidez nos mercados financeiros.
A capacidade de os mercados financeiros gerarem "valor", na verdade, depende do desenvolvimento de "convenções" (bolhas especulativas), capazes de criar expectativas tendencialmente homogêneas, que empurram os principais operadores financeiros a se concentrarem em determinados tipos de atividades financeiras. Nos anos 1990, de fato, foi a Net-Economy, na década de 2000 a atração veio do desenvolvimento dos mercados asiáticos (a China entrando na OMC, em dezembro de 2001) e imobiliário.
Hoje a tendência é concentrar-se na manutenção do welfare europeu. Independentemente do tipo de acordo dominante, o capitalismo contemporâneo está constantemente procurando novas áreas sociais e vitais, onde devorar e mercantilizar, até interessar-se, crescentemente, nas que são as faculdades vitais dos seres humanos. É o que, nos últimos anos, chamou-se de bioeconomia e biocapitalismo. Podemos, então, propor a junção do capitalismo cognitivo com a bioeconomia: “capitalismo biocognitivo” é a definição terminológica do capitalismo contemporâneo.

“A polarização das rendas aumenta o risco de insolvência das dívidas, que estão na base do crescimento da mesma base financeira, e diminui o salário médio”


IHU On-Line - Por que a crise financeira, enfrentada em diversos países, é uma crise de governança financeira do biopoder atual? A partir deste cenário, em que medida se pode dizer que a financeirização atinge todas as áreas de nossas vidas? Quais são as implicações fundamentais?
Andrea Fumagalli - Os mercados financeiros são o coração batendo, o conhecimento do cérebro, as atividades relacionais, o sistema nervoso. O capitalismo biocognitivo é um corpo único, no qual não é possível separar a esfera do "real" da esfera "financeira"; a esfera produtiva, da esfera improdutiva; o tempo de trabalho, do tempo de vida; e a produção, da reprodução e do consumo.
Em geral, a financeirização marca a transição final do dinheiro-mercadoria para o dinheiro-símbolo. Com a desmaterialização total do dinheiro (após o colapso de Bretton Woods, em 1971, e do fim da paridade fixa dólar-ouro), os mercados financeiros definiram convenções sociais e hierárquicas capazes de fixar, em pouco tempo, o valor da moeda. E, ao mesmo tempo, permitem que se mantenham abertas as relações de débito e crédito, contanto que haja confiança suficiente nos operadores.
Os mercados financeiros, portanto, fornecem o lubrificante para o processo de acumulação: no sistema capitalista, no entanto, não existe acumulação sem endividamento. Não é por acaso que, dos anos 1990 em diante, proveem o financiamento das atividades de acumulação: a liquidez atraída pelos mercados financeiros premia a reestruturação da produção voltada a explorar os conhecimentos e os controles dos espaços externos da empresa.
Em segundo lugar, na presença de mais-valia, os mercados financeiros desempenham, no sistema econômico, o mesmo papel que no capitalismo fordista-industrial era desempenhado pelo multiplicador keynesiano (ativado pelos gastos deficitários). No entanto - ao contrário do clássico multiplicador keynesiano -, o novo multiplicador financeiro leva a uma redistribuição distorcida da renda. Para que este multiplicador seja operacional (>1) requer-se que a base financeira (ou seja, a extensão dos mercados financeiros) esteja constantemente em aumento, e que os ganhos decapital acumulados sejam, em média, superiores à perda do salário mediano. Por outro lado, a polarização das rendas aumenta o risco de insolvência das dívidas, que estão na base do crescimento da mesma base financeira, e diminui o salário médio. Daqui resulta que o biocapitalismo cognitivo é estruturalmente instável.
Quando o lucro vira renda
Em terceiro lugar, os mercados financeiros, canalizando de forma forçada parte crescente da renda do trabalho(liquidação e previdência, além das rendas que, através do Estado social, se traduzem em instituições de tutela da saúde e da educação pública), substituem, assim, o Estado como segurador social. Deste ponto de vista, eles representam a privatização da esfera reprodutiva da vida.
Finalmente, os mercados financeiros são o lugar onde se fixa hoje a valorização capitalista, ou seja, o local da medição da exploração da cooperação social e do intelecto geral através da dinâmica de valores de mercado. O lucro é transformado, assim, em renda (cf. Tese 3), e os mercados financeiros tornam-se o lugar da determinação do valor-trabalho, que é transformado em valor-financeiro, que não é senão a expressão subjetiva de futuros lucros obtidos pelos mercados financeiros, que se apropriaram, dessa forma, de uma anuidade. Os mercados financeiros exercem, por conseguinte, o biopoder.

“A democracia está morta exatamente no momento que tem início a parábola do capitalismo cognitivo”

 



IHU On-Line - Neste contexto, que importância tem o neoliberalismo como fundamento da financeirização?
Andrea Fumagalli - O pensamento neoliberal fundamenta-se no conceito de neutralidade da moeda e na suposição da perfeita competição nos mercados financeiros. Na verdade, os mercados financeiros não são imparciais e neutros, mas expressão de umahierarquia bem precisa: longe de serem concorrenciais, escondem uma pirâmide que vê, na parte superior, poucos operadores financeiros controlando mais de 65% de fluxos globais e, na base, uma miríade de pequenos investidores e operadores desempenhando uma função passiva. Tal estrutura permite que poucas empresas tenham capacidade de atingir e afetar a dinâmica do mercado. As agências de rating (amiúde em conluio com as financeiras) ratificam, de modo instrumental, decisões oligárquicas, tomadas de tempos em tempos.
Com tal farsa, o pensamento neoliberal tenta fazer passar como objetiva, neutra e naturalmente dada, uma estrutura de poder que, ao contrário, objetiva favorecer uma distribuição que vai dos mais pobres para os mais ricos.
IHU On-Line - Quais são os espaços e os limites da democracia neste cenário? Que novas formas políticas surgem como resistência e confronto?
Andrea Fumagalli - No mesmo momento em que as hierarquias do mercado ditarem as escolhas da política econômica, e o próprio mercado estabelecer as regras das relações humano-sociais, a democracia, entendida como processo de decisão resultante de um princípio dialético, está morta. A democracia está morta exatamente no momento que tem início a parábola do capitalismo cognitivo.
IHU On-Line - Vale a pena analisar esta predominância da economia sobre a política como elemento explicativo da desconfiança da política e da apatia dos eleitores? Por quê?
Andrea Fumagalli - A desconfiança da "política" surge no exato momento em que ela se torna uma caixa vazia, que ratifica decisões tomadas em outros lugares. É consequência, não causa, da prevalência do poder econômico sobre o poder político e sobre o direito.
IHU On-Line - Como entender que governos de esquerda, como no Brasil, Bolívia e Equador, professem um modelo de desenvolvimento não sustentável, ignorando as terras indígenas com a construção de barragens e estradas, por exemplo?
Andrea Fumagalli - As compatibilidades econômicas e a subsunção da vida e da natureza são alheias às diferenças entre "direita" e "esquerda", enquanto normas garantem um processo de acumulação originária, da qual, junto à exploração e à comercialização da vida, o processo de valorização não pode prescindir. No limite, se houver alguma diferença entre direita e esquerda, elas dirão respeito não à esfera das modalidades de acumulação, mas à esfera da distribuição. Uma lei como o Bolsa Família, por exemplo, dificilmente teria sido promulgada por um governo de direita.
IHU On-Line - De que modo se pode falar de outra economia, num contexto marcado pela hegemonia do mercado financeirizado?
Andrea Fumagalli - Pode-se falar de "outra economia", se esta outra economia não só puder exercitar o poder de decisão sobre como produzir, o que produzir e de que modo produzir, mas, propedeuticamente, tiver autonomia de decisão, não sujeita às restrições e ao comando da financeira. E, para chegar a essa autonomia decisional (que, por exemplo, a Grécia não pode exercer, apesar de Syriza ter conquistado poder decisional), é necessário autonomia, do ponto de vista do circuito monetário-financeiro. Para isto, então, é necessário construir um circuito monetário alternativo, complementar e não substitutivo do tradicional, submetido ao comando da Troika, emitindo, sob controle democrático, uma moeda paralela, utilizável para produção de valor de uso interno, de trabalho e de impostos. Chamamos esta moeda complementar de Moeda Social!

 


“O nível de entropia da produção atual é tal, que o globo terrestre corre o risco de transformações climáticas irreversíveis”


IHU On-Line - No interior de uma companhia capturada pelo dispositivo financeirizado, como analisa as críticas do Papa Francisco à globalização da indiferença e o lançamento da encíclica Laudato Si’, que prega uma ecologia integral, em termos ambiental, econômico e social?
Andrea Fumagalli - Acredito que seja um convite à governança capitalística em grau de levar a sério os vínculos do ecossistema, que agora, em termos físicos, foram alcançados. O nível de entropia da produção atual é tal, que o globo terrestre corre o risco de transformações climáticasirreversíveis.
IHU On-Line – Em entrevista à IHU On-Line, em 2010, você disse que um dos principais efeitos do biocapitalismo sobre o trabalho é o controle das faculdades cognitivas do ser humano, e não apenas o disciplinamento do corpo. Quais são os impactos desta realidade para a autonomia e para a subjetividade dos contemporâneos?
Andrea Fumagalli - Este acompanhamento, que hoje chamaríamos de "subsunção da vida", é realizado através de três mecanismos principais: precariedade (envolvendo chantagem), dívida (que implica dependência e culpabilidade) e competição individual (que implica tendência ao reconhecimento social e ao mérito, em detrimento dos outros). Todos convergem em direção a um comportamento autointeressado e a uma ruptura dos laços sociais, como também à criação de um consenso passivo tal para garantir o poder existente e impotencializar quem luta por um mundo melhor.
IHU On-Line - Em que medida este controle das faculdades cognitivas torna-se trabalho precário e de sujeição do trabalhador?
Andrea Fumagalli - Por meio da chantagem, da dívida, da (parcial) lobotomia cerebral, da resignação.
Por Márcia Junges / Tradução: Ramiro Mincato

O Golpismo do vetusto vil FHC





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Política

Editorial

Eterno golpismo

Miúda reflexão sobre impeachment, democracia e Estado de Direito no país da casa-grande
por Mino Carta publicado 18/09/2015 06h25
Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Na esteira do Cruzado 1, em outubro de 1986 José Sarney cometeu estelionato eleitoral logo após a vitória peemedebista nas eleições para os governos estaduais, Congresso e Assembleias, ao lançar o Cruzado 2 e arrastar o País para uma crise econômica de grande porte. A situação, complicada pelo fracasso da moratória do começo de 87, perdurou até o fim do mandato de Sarney.
Nem por isso se cogitou, em momento algum, do impeachment do ex-vice-presidente tornado presidente pela morte de Tancredo Neves, em claro desrespeito a qualquer regra do jogo pretensamente democrático.
Ao lançar o olhar além-fronteiras, temos o exemplo recente de Barack Obama, atingido em cheio pela explosão da bolha financeira de 2008, a mergulhar os Estados Unidos em uma crise de imponentes proporções. Obrigado a enfrentar a queda progressiva do valor do dólar, assoberbado pelas habituais pressões e ameaças das agências de rating, vítima de índices de aprovação cada vez mais rasos, Obama acabou sem o apoio da maioria parlamentar. Nem por isso sofreu o mais pálido risco de impeachment, mesmo porque hipóteses a respeito seriam simplesmente impensáveis aos olhos dos parlamentares americanos, mesmo republicanos.
Fernando-Henrique
FHC o mereceu, mas goza da impunidade automática / Crédito: Fernando Donasci/Ag. O Globo
Se a ideia já teve no Brasil razão de vingar, ao menos de ser aventada, foi em relação a Fernando Henrique Cardoso: comprou votos para se reeleger e comandou privatizações que assumem as feições inequívocas das maiores bandalheiras-roubalheiras da história pátria, realizadas às escâncaras na certeza da impunidade. Praticante emérito do estelionato eleitoral, fez campanha para a reeleição à sombra da bandeira da estabilidade para desvalorizar o real 12 dias depois da posse para o segundo mandato.
FHC é recordista, conseguiu quebrar o Brasil três vezes. Ao cabo, entregou a Lula um país endividado até a raiz dos cabelos e de burras vazias. Ao longo da sua trajetória presidencial, jamais se imaginou a possibilidade do seu impeachment.
O príncipe dos sociólogos, outrora encarado como elemento perigoso por quantos hoje o veneram, tornou-se xodó da mídia nativa e dos senhores da casa-grande. Favor irrestrito e justificado: nunca houve alguém tão capacitado para a defesa dos interesses do reacionarismo na sua acepção mais primitiva.
Hoje em dia, FHC arca com o papel de oráculo da política brasileira com invulgar destemor. Tudo dentro dos conformes, a desfaçatez, a hipocrisia e o oportunismo tucanos não têm limites. O enredo é típico, assim como já é clássico o caso de Fernando Collor, que se retirou antes de sofrer impeachment. Exemplar entrecho, de todos os pontos de vista, que vivi de perto por mais de dois anos, quando dirigia a redação de IstoÉ.
Para mim a história começa 25 anos atrás. O então repórter da IstoÉ Bob Fernandes tocaia por dois meses o operador do presidente, PC Farias. Chega a hospedar-se por algum tempo no apart-hotel, onde em São Paulo vive o tocaiado. Enfim a revista publica uma reportagem de capa sobre as façanhas do PC, em que se relata tudo aquilo que o irmão de Collor diria a Veja um ano e meio depois, com exceção dos supositórios de cocaína.
Eis aí, neste roteiro, um aspecto ineludivelmente brasileiro. Quando da reportagem, a mídia cuidou de não lhe dar eco e seguimento, ao contrário do que se daria em qualquer país democrático e civilizado.
Até então, a casa-grande suportava que o presidente cobrasse pedágios elevadíssimos em relação a obras feitas e ainda assim o imaginava adequado ao cargo de propiciador de benesses. Fora a Veja, aliás, que popularizara a definição de Collor como “caçador de marajás”.
Com o tempo, a cobrança collorida passou a ser considerada insuportável e se entendeu que valeria submeter o cobrador a um aperto sério, embora comedido. Foi a hora da entrevista do irmão, esta sim imediatamente repercutida.
A CPI convocada para cuidar do caso moeu meses de sessões inúteis à falta de provas. Não fosse IstoÉ, daria em nada. A sucursal de Brasília da revista, dirigida por João Santana, foi capaz de demonstrar a ligação entre a Casa da Dinda e o Palácio do Planalto, e o encaminhamento do impeachment foi inevitável.
A Globo prontificou-se a chamar para as praças manifestações bastantes parecidas àquelas que pipocam de dois anos para cá, frequentadas, sobretudo, por burguesotes festeiros, enquanto a Veja ganhava o Prêmio Esso de Jornalismo, remota invenção alienígena destinada a consagrar o jogo corporativo, festival do compadrio da mídia nativa.
Há quem diga que estamos a transitar por uma conjuntura similar àquela, e se engana, está claro, por hipocrisia ou ignorância. O impeachment de Dilma Rousseff é totalmente impossível à luz da Constituição. Se quiserem mandar as aparências às favas, seria golpe mesmo, conforme conhecimento até do mundo mineral. Mas golpismo é inerente ao país da casa-grande. Editoriais, colunas, artigos e reportagens dos jornalões recordam, cada vez mais, os textos de 51 anos atrás.

Juridicamente, contra Dilma, não há nada


'Contra Dilma, não há nada'

:
Autor da denúncia que levou ao impeachment de Fernando Collor, em 1992, o advogado Marcelo Lavenère deveria ser uma referência obrigatória na reflexão sobre o pedido de afastamento de Dilma Rousseff, em 2015. Mas Lavenère tem sido esquecido sistematicamente pelos meios de comunicação que apoiam o impeachment, e também pelos políticos envolvidos na ação contra a presidente. Em entrevista ao 247, o próprio Lavenère explica a razão:
--  Vários jornalistas que cobrem as denúncias  contra  Dilma já me ligaram para pedir que eu fale sobre o impeachment do Collor. Mas quando eu digo que são situações muito diferentes e que eu acho que não há a menor razão para se falar em impeachment da Dilma, eles perdem o interesse e desistem da entrevista.
Então eu vou fazer a pergunta ao senhor, que assinou a denúncia em 1992, ao lado do jornalista Barbosa Lima Sobrinho (morto em 2000). Por que não se pode comparar os dois casos?
A denúncia contra o Fernando Collor teve como base uma apuração detalhada sobre o envolvimento do presidente. Sob presidencia do então senador Amir Lando, uma CPI mixta produziu um relatório denso e detalhado, mostrando seu envolvimento de forma clara. As conclusões contra Collor eram indiscutíveis, a tal ponto que o relatório foi aprovado por unanimidade. Quem ler o relatório, ainda hoje, ficará impressionado com sua consistência.
Ninguém tinha dúvidas sobre a responsabilidade do Collor, portanto...
Não. Vou contar uma coisa. Eu só apresentei a denúncia porque recebi um pedido dos principais partidos do Congresso. Foi o próprio Fernando Henrique Cardoso, em nome do PSDB, quem me procurou dizendo que eu tinha de assinar o pedido. O Senador Pedro Simon falou pelo PMDB. O Aldo Rebelo, pelo PC do B e o Vivaldo Barbosa pelo PDT. Eram os grandes partidos brasileiros, falando por suas lideranças mais respeitadas. O PT, partido do Lula, derrotado por Collor em 1989, não assinou o pedido.
Já é uma mudança. Em 2015, o PSDB de Aécio Neves, que foi derrotado no ano passado,  lidera a pressão pelo impeachment, abertamente. Quais são as outras diferenças?
Do ponto de vista jurídico, falar em impeachment contra a Dilma é uma brincadeira. Não existe -- e é até difícil falar daquilo que não existe.
O senhor poderia explicar melhor?
Contra Collor, haviam fatos. Contra a Dilma, não há nada. Há um movimento político, que vinha desde a campanha. É aquela velha visão autoritária, que dizia: ela não pode se eleger; se for eleita, não tomará posse; se tomar posse, não poderá governar. Depois que Dilma passou pelas etapas anteriores, nós chegamos a este estágio. Sem prova nenhuma, sem fato algum, em que se tenta impedir de qualquer maneira uma presidente eleita de governar. Os  fatos não importam aqui. A prioridade é política: precisam encontram fatos capazes de  impedir seu governo. É uma decisão política, que querem cumprir de qulaquer maneira.
Mas tem a acusação das pedaladas...
Nem vou discutir o mérito das pedaladas, se podem ser consideradas um crime ou não. A  discussão é anterior. Estão desrespeitando um ponto fundamental, definido pela Constituição de 1988. As pedaladas não podem servir para acusar uma presidente.
Por que?
Durante a Constituinte, o Celso Mello, que esteve na Casa Civil do José Sarney  e depois se tornou ministro do Supremo, deu uma contribuição importante  à redação do capítulo do impeachment. Ele ajudou a deixar claro aquele ponto que diz que um presidente só pode ser julgado por fatos ocorridos durante o seu mandato. Para falar claramente: se descobrirem que a Dilma matou 50 crianças antes de 2015, isso não pode ser usado contra ela antes do fim do mandato. Ela vai responder por seus atos, mas depois. Isso está bem claro na Constituição. É só ler o que os constituintes escreveram.
O senhor não pode ser acusado de tentar defender a presidente de qualquer maneira?
Não. Se aparecer uma prova contra ela, vou defender que seja processada. Vou lamentar, porque não espero isso nem acredito que isso vá acontecer. Mas se ocorrer, não há alternativa. Mas não é a situação agora. O que temos, hoje, é a vontade política de impedir a Dilma de governar e só isso.