quinta-feira, 1 de agosto de 2019

Bolsonaro é a banalização do mal, do cinismo, do escravagismo, do ódio pelo ódio.

Bolsonaro é uma aberração sob o ponto de vista humanista e civilizatório, mas seu governo é mais do que isto; trata-se de um bloco de forças sociais, empresariais e burocráticas, neoliberal e autoritário, com relações internacionais, disposto a muito para consolidar seu poder e riqueza.

Há mais coisas no céu do que Bolsonaro e Mourão
Brasil de Fato31 de julho de 2019 16:39


Afastar o presidente excêntrico antes da hora poderia, paradoxalmente, estabilizar esse bloco no poder e seu programa de exploração / Foto: Marcos Corrêa/PR
Nos últimos dias a ideia do impedimento constitucional de Jair Bolsonaro, o impeachment, cresceu e transitou pelos mais variados setores, até mesmo foi citado como uma alternativa por liberais arrependidos ou assustados, entre os quais alguns conservadores e golpistas.
Não é sem motivo aparente. O conjunto de declarações e medidas do governo dá a dimensão de um presidente nada afeito à democracia e não submisso a Constituição Federal. Além do envolvimento com milícias criminosas, defesa de nepotismo, quebra de decoro diplomático e intervenção em universidades federais; declarações homofóbicas, racistas e preconceituosas, incentivo ao armamento, proselitismo autoritário e apologia ao crime de tortura inundaram a política brasileira e correram o mundo em uma desconstrução sem precedentes dos avanços mínimos conquistados neste país, sejam eles econômicos, políticos e éticos. Bolsonaro é a banalização do mal, do cinismo, do escravagismo, do ódio pelo ódio. Trata-se, como se referiu Hannah Arendt acerca de Adolf Eichmann, de um homem comum na sua mediocridade e excentricidade que encontrou as condições políticas para a banalização e mitificação do ódio e do mal. Pois é sobre essa condição política, a que permite o ressurgimento do reacionarismo fascista, que devemos nos debruçar e investir o melhor das energias democráticas para reverte-la e não parecer acreditar que a simples remoção do homem banal e excêntrico, do homem mal, mudará o quadro.
Bolsonaro jogou o país em uma luta ideológica entre a barbárie e a civilização. Ele consolidou um campo de sustentação baseado em uma articulação entre valores e políticas reacionárias e fascistas com o ultra neoliberalismo.
Exatamente por isso não podemos incorrer no erro de reduzir o debate político e ideológico ao tema do impeachment de Bolsonaro. Seria dar “cancha” livre para esse bloco, ultrarreacionário, implementar um programa de eliminação de direitos sociais e trabalhistas com nova legitimidade, descartando seu presidente excêntrico e banal. Jair Bolsonaro é uma aberração sob o ponto de vista humanista e civilizatório, mas seu governo é mais do que isto; trata-se de um bloco de forças sociais, empresariais e burocráticas, neoliberal e autoritário, com relações internacionais, disposto a muito para consolidar seu poder e riqueza.
O impeachment é uma ferramenta própria da democracia, prevista na Constituição do Brasil, mas sua utilização não pode se prestar, como no caso da deposição da Presidenta Dilma, a servir de peça de manobra para golpistas consolidarem seu poder a despeito da soberania popular. Uma movimentação para afastar Bolsonaro sem base popular organizada pode acabar consolidando o bloco reacionário neoliberal que poderia desejar tal desfecho, ainda mais legitimado na “opinião pública”, sempre tão efêmera quanto manobrável. A proposta de impeachment desassociada de uma nova correlação de forças e de um movimento democrático ascendente, assim, incorre em dois erros. O primeiro deles é uma má interpretação do que representa Bolsonaro com a decorrente confusão sobre o verdadeiro adversário dos interesses populares, e o segundo repousa em um crença ingênua no caráter republicano e neutro das instituições estatais do sistema político.
Em que pese a tentação, não podemos reduzir Bolsonaro a sua excentricidade, a sua dimensão individual mas considera-lo a partir de sua condição política. É a “pessoa jurídica” e não física que deve ser enfrentada. Ele é hoje a expressão articulada de um bloco de forças distintas mas que converge na necessidade de redução da democracia no Brasil, para implementar medidas de subtração da riqueza do trabalho e da soberania nacional. As duras medidas de espoliação do trabalho, como a reforma trabalhista e da previdência, somente são possíveis em um ambiente hegemônico onde as causas democráticas, de defesa dos pobres e dos trabalhadores e de conceitos igualitaristas estejam na defensiva. Esse bloco é inteiramente subordinado e, portanto, apoiado e sustentado pelo capital financeiro internacional, totalmente interessado no esbulho da riqueza contida no Brasil, inclusive da riqueza da capacidade de trabalho da classe trabalhadora.
O afastamento de Bolsonaro não implicaria na mudança do bloco dirigente no Brasil. Afastar o presidente excêntrico antes da hora poderia, paradoxalmente, estabilizar esse bloco no poder e seu programa de exploração.
A correlação de forças não indica uma reação dos setores democráticos, nacionalistas, de valores humanistas e no sentido de um novo governo de caráter, ao menos, nacional e distributivista. Portanto, a política do impeachment não estaria assentada em uma alteração da hegemonia política e da correlação de forças em favor da maioria e da democracia; mas estaria assentada na ilusão de uma certa “reabilitação” do caráter republicano das instituições estatais como o STF e Congresso Nacional. Uma espécie de ilusão na restauração da neutralidade dessas instituições.
Ora, o Estado não é neutro, tampouco a democracia. Eles respondem à hegemonia dominante e suas classes dirigentes. Essas instituições estatais cumpriram um papel fundamental para a legitimação da ascensão ao governo de bloco reacionário e neoliberal. A correlação de forças indica que essas instituições atuarão para a estabilização desse programa e desse bloco, mesmo que para isso seja necessário o impeachment de Bolsonaro para substituí-lo por alguém mais equilibrado e articulado para dirigir um governo com essas tarefas. Seria pouco provável que as instituições que deveriam zelar pela Constituição Federal, como o STF e o Congresso Nacional, garantissem a convocação de eleições como está na norma, para falar objetivamente do que deveríamos defender.
O resultado mais plausível para se projetar a partir do impeachment precipitado seria o da reorganização desse bloco reacionário neoliberal com maior capacidade dirigente, a partir de uma rearticulação do empresariado, da burocracia e da maioria conservadora no Congresso. Não há condições, hoje, de se imaginar que o fim da presidência de Bolsonaro fosse seguido pela convocação de eleições no Brasil, mas sim por mais um golpe contra a Constituição Federal, através de um novo acordo entre as elites que levaria sua substituição por um quadro mais preparado, do mesmo campo, para o que já se apresentam o Vice-Presidente da República e o Presidente da Câmara dos Deputados. Seria a forma de atingir a construção de um governo passando ao largo de eleições justas e limpas. O impeachment funcionaria como uma espécie de lavagem constitucional do golpe político continuado, aberto em 2015; exatamente em um momento que o impeachment da Dilma, a operação Lava-Jato e a prisão de Lula sofrem seus mais profundos questionamentos. O impeachment precipitado pode ter um efeito reverso, ser a chave para a derrota definitiva da narrativa sobre o golpe e a deslegitimação dos processos da Lava-Jato.
A defesa dos interesses nacionais, de seu patrimônio e de suas riquezas, e dos interesses dos trabalhadores, como a reversão da reforma trabalhista e previdenciária e o descontigenciamento de recursos públicos, precisa ter outra tática política. É preciso derrubar não o presidente, mas as bases políticas do bloco reacionário e neoliberal que sustenta o governo Bolsonaro. Precisamos desconstituir as bases populares e as alianças que sustentam o governo para então projetar novo governo de caráter não neoliberal e mão o inverso. A denúncia da operação Lava-Jato, o desmascaramento do papel da burocracia golpista, a denúncia das privatizações, a luta pela obstaculização das reformas trabalhistas e previdenciária, o combate ao monopólio da mídia privado, estão entre essas tarefas centrais e são chaves para alterar a correlação de forças na sociedade. É preciso questionar e lisura das últimas eleições e a legitimidade de seu resultado, o que afeta todo o governo e não somente seu presidente. A mobilização em defesa da universidade pública, dos direitos fundamentais, da sustentação das denúncias da Vaza-Jato, continuam a ser as movimentações com maior capacidade aglutinadora e de constituição de uma frente anti reacionária. É preciso derrotar esse governo no conjunto. O centro de ação do campo popular neste país deve ser a denúncia dos fatores e sujeitos que sustentam a super exploração do trabalho e o crescimento do fascismo e do reacionarismo.
A amplitude e simbolismo do ato de desagravo ao Glenn Greenwald, neste 29 de julho, mostram que as revelações sobre o processo farsesco e fraudulento da Lava Jato tem grande capacidade aglutinadora de um novo campo político em formação no país e que novas revelações sobre ainda poderão ampliar essa frente e, em um ambiente de grave crise econômica e de emprego e trabalho, modificar essa correlação de forças.
A queda de Bolsonaro deve ser a queda do bloco que o sustenta e não só do presidente, caso contrário o bloco reacionário terá mais legitimidade e, portanto, força para implementar suas medidas e avançar na situação autoritária. É preciso expor suas bases ilegítimas para substituí-lo através da restituição da soberania popular, nas eleições gerais, sem golpe continuado.

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Governadores lançam Consórcio Nordeste


Após insulto de Bolsonaro, governadores lançam Consórcio Nordeste




Flávio Dino: “enquanto alguns querem criar conflitos, nós queremos trabalho, ação e resultados" (Valter Campanato/Agência Brasil)
Dez dias após o presidente Jair Bolsonaro ter azedado a relação com governadores do Nordesteao insultá-los em um café da manhã com jornalistas, o que foi respondido com uma carta de repúdio assinada pelos líderes estaduais, nesta segunda-feira, 29, os nove estados que compõem a região deverão formalizar um pacto batizado de Consórcio Nordeste.
A iniciativa, que já havia sido anunciada e estava sendo aprovada nas assembleias estaduais, visa uma maior cooperação política, econômica e social para alavancar o crescimento da região.
Além do lançamento oficial do Consórcio que neste primeiro ano será presidido pelo governador Baiano Rui Costa (PT), a ideia do encontro desta segunda-feira é dar os primeiros passos para decidir o plano de trabalho do pacto que foi anunciado no mês de março.
Com o acordo, os governadores da região esperam realizar projetos conjuntos, atrair mais investimentos e criar fundos de financiamento e captação de recursos.
A iniciativa prevê, por exemplo, fazer grandes licitações conjuntas entre os estados para a compra de materiais, assim reduzindo os custos que seriam praticados em aquisições de menor escala. Também será possível a realização de parcerias em áreas como educação, turismo, troca de tecnologia e ações de preservação ambiental.
  • BRASIL 23 jul 2019 - 13h07
O encontro que será sediado na Bahia deve tratar das recentes polêmicas envolvendo o presidente Jair Bolsonaro. Essa será a primeira vez que todos os governadores da região irão se reunir após terem assinado uma carta de repúdio às falas de Bolsonaro.
Numa gravação vazada durante um café da manhã com jornalistas há dez dias, Bolsonaro disse ao ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que “daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão”, se referindo a Flávio Dino, do PCdoB. “Paraíba” é um termo pejorativo usado no Rio de Janeiro para se referir a nordestinos.
Após a declaração, o governador da Bahia, Rui Costa, que encabeça a liderança do Consórcio que será lançado hoje, deixou de comparecer à inauguração de um aeroporto em Vitória da Conquista, evento que contou com a presença de Bolsonaro.
Ao portal de notícias UOL, o alvo do presidente, Flávio Dino, declarou que “enquanto alguns querem criar conflitos, nós queremos trabalho, ação e resultados. É isso que vamos procurar distinguir, então a reunião vai ser marcada sobretudo pela agenda do Consórcio Nordeste”, disse.
Para o governo federal, a iniciativa pode trazer um complicador na tramitação da reforma da Previdência, que ainda precisa ser votada em segundo turno na Câmara e depois no Senado.
Embora não tenha ingerência sobre suas bancadas, os governadores nordestinos já conseguiram tirar estados e municípios do texto, e podem fazer pressão por novas alterações. O Nordeste tem 151 deputados (29% do total) e 27 senadores (33% do total).

Moro não é diferente do nazista Himmler ao legalizar os abusos no processo legal

"Ter abatido essa gente toda de uma só vez e mantermo-nos pessoas decentes foi isso que nos fortaleceu."


Moro vai mais longe do que o nazista Himmler ao legalizar os abusos no processo legal
Luiz Muller28 de julho de 2019 15:03


Sérgio Moro e sua ‘solução final’
.Por Sandro Ari Andrade de Miranda.“A maior parte de vós deve saber qual o aspecto de cem cadáveres estendidos lado a lado, ou de quinhentos, ou até mil. Ter abatido essa gente toda de uma só vez e mantermo-nos pessoas decentes foi isso que nos fortaleceu. Essa é uma página de glória como foi escrita e nem voltará a escrever-se na nossa história”. (Heinrich Himmler, discurso de Posen, para oficiais da SS Nazista, em 04/10/1943)
(foto fabio pozzebom ag brasil e reprodução)
Comparar Sérgio Moro com Heinrich Himmlernão é nenhum exagero. Ambos possuem o mesmo perfil, buscam o poder, parecem racionais e pedantes ao mesmo tempo, não demonstram limites morais para as suas ações e nutrem um fanatismo gigantesco em torno do seu projeto de poder pessoal, ao ponto de adotar medidas políticas absurdas.
Himmler foi o grande arquiteto da “Solução Final”, na qual pretendia levar 11 milhões de judeus e ciganos para as câmaras de gás. Não atingiu a sua meta. Mas na mais otimista das avaliações, exterminou, em processo industrial, 6 milhões de vidas apenas nesta ação. Isto sem contar os 3 milhões de soldados e civis soviéticos que foram mortos em campos de concentração e das milhares de execuções colocadas em prática pela SS e pela Gestapo sobre o comando do “leal Heinrich”.
Se o fascismo é um movimento de desumanização, o nazismo foi o seu ponto culminante.Nunca, em nenhum momento da história, tantas pessoas tiveram as suas vidas ceifadas com tamanha frieza. Em termos de escala, o genocídio executado pelos nazistas só possui a concorrência do massacre dos povos nativos americanos pelos europeus.
Em termos de compressão do tempo (apenas 7 anos) e de métodos, não existe comparação. O nazismo foi o primeiro movimento genocida que planejou e executou um processo de extermínio adotando métodos de racionalidade industrial. Interessante lembrar que as primeiras experiências de Himmler foram realizadas com asfixia individual e fuzilamento. Depois ele mesmo achou que o método poderia “baixar a moral das tropas”, então preferiu a estratégia científica da “câmara de gás”. Os cadáveres já saiam sem vida para as covas coletivas, sem que os soldados alemães presenciassem o sofrimento daqueles cujo os pulmões eram devorados por ácido venenoso.
Mas não pensem que as ações de Himmler se limitavam aos campos de concentração. Ele também conduziu a “limpeza ideológica” dentro das escolas alemãs. Antes dos campos de concentração virarem a regra, milhares de intelectuais considerados como oposicionistas foram mandados para Dachau já com a certeza de morte. Nisto foram acompanhados por mendigos, deficientes físicos, doentes mentais, homossexuais e todos aqueles que fossem considerandos como potenciais ameaças ao arquétipo da raça ariana. O massacre e perseguição dos intelectuais tinha uma motivação: “recontar a história, mudar a narrativa para um mundo idealizado nos delírios nazistas, no qual os alemães eram descendentes da figura mitológica dos arianos”.
Se fizermos uma viagem no tempo e traçarmos um comparativo entre o fascismo da década de 1930 e o atual, vamos notar diferenças e muitas semelhanças.
Na atualidade, muitas das formas de opressão já estão inseridas no contexto simbólico de dominação. O marketing da violência é o maior exemplo. Se Himmler viveu a época da grande industrialização em espaços concentrados, do fordismo, hoje possuímos uma descentralização produtiva, muitas vezes levadas para o ambiente doméstico e o uso de métodos de controle virtuais. Além disto, o grande aparato de mídia permite recontar histórias e transformar chacinas em atos de defesa da população. Pois é exatamente isto que representa a criação de excludentes de ilicitude legitimando a violência policial.
Os números são claros, os resultados práticos da legitimação desse tipo de conduta aberrante já são sentidos nos primeiros dias de 2019. Em São Paulo as vítimas de autos de resistência aumento em 24,89% apenas em Janeiro. Já em Santa Catarina, este índice saltou 250% para cima apenas nos primeiros 40 dias do ano.
Na mesma semana em que Sérgio Moro apresentou o seu projeto de pseudo-combate à violência, a polícia do Rio de Janeiro chacinou 13 pessoas em ação no Morro de Santa Teresa. Se o Brasil já possui números de guerra civil em termos de mortes violentas, a tendência é que estes indicadores saltem em progressão geométrica no ano de 2019 e sem perspectivas de queda.
A verdade é que Sérgio Moro adaptou os métodos de Himmler para a hiper-realidade contemporânea. Se o nazismo utilizava a força para impor o seu regime de terror, Moro pretende utilizar a legitimação do abuso de poder e a violação de direitos fundamentais como instrumento principal para por em prática a sua solução final.O fascismo contemporâneo se impõe pelo uso de símbolos e de estigmas como instrumentos de destruição ou de autodestruição.
Os cidadãos armados, jogados uns contra os outros e policiais orientados para a eliminação sumária de suspeitos, são apenas uma parte da estratégia, aplicada no varejo da violência com o genocídio já existentes de jovens pobres, em sua maioria negros, estigmatizados por uma perfilhação criminal racista.
A outra proposta, e talvez seja a principal, é a morte em vida, com a destruição moral e da biografia dos adversários políticos e sociais. Além de jovens negros, pobres que moram no morro, já estão incluídos no perfil atacado pelo fascismo brasileiro os militantes sociais esquerdistas, indígenas que ocupam legitimamente as suas terras, feministas e “professores doutrinadores”.
Não existe nenhum impedimento para a execução concomitante dos dois métodos de extermínio, pois as mulheres já são vítimas das balas do feminicídio, os povos indígenas da ação dos jagunços dos ruralistas e os militantes sociais de emboscadas. Sempre lembrando, o Brasil é o campeão mundial de homicídios de militantes sociais e defensores dos direitos humanos, com 1 morte a cada 5 dias.
A atuação de Sérgio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba foi um laboratório para a violação de direitos humanos. Prisões cautelares sem provas, pressão para colaborações premiadas suspeitas, algumas flagrantemente ilegais e inválidas, e a tortura como prática de obtenção de confissões forçadas. Ou alguém acha que uma prisão cautelar, isolado, com o nome pessoal e da família sendo dilapidado diariamente por uma agenda estrutura de mídia não é uma forma de tortura?
A violência moral e simbólica é hoje a forma mais eficaz de tortura, pois destrói com a vida de pessoas antes de serem julgadas ou de existir qualquer tipo de prova ou indício para a acusação. Se o jornalismo investigativo sério ajuda a trazer muitas coisas escondidas para a verdade, a fabricação da notícia por agenda, como método de propaganda contra a moral individual ou de um grupo, tal qual executado pela 13ª Vara Federal de Curitiba, é sim uma forma de tortura.
Sabedor da eficácia deste método de violência, o ex-juiz paranaense tenta impor a sua estratégia de agressão e medo por meio de um projeto de lei que, supostamente, visa combater a corrupção e a violência. Na prática é um somatório de violações extremas da dignidade humana, de direitos fundamentais e a instalação formal do estado polícia, fiel ao método de Himmler.
Mas o aparato policialesco de Moro vai ainda mais longe. Se a aparência formal de uma democracia concorrencial diferencia os dois modelos de fascismos. Algumas estratégias são idênticas, e o maior exemplo é a anunciada perseguição de professores e intelectuais universitários.
O Protocolo firmado entre o MEC e o MJ, sob o ponto de vista jurídico, é absolutamente inútil, pois ambos são estruturas da administração direta da União. Contudo, a utilização deste ato como um instrumento de declaração de guerra aos intelectuais e de estigmatização política, tem grande força simbólica.
Os vilões, não são as milícias e o jagunços que executam civis inocentes pelo país, mas professores e pesquisadores. Assim como no nazismo alemão, no fascismo brasileiro é anti-intelectual, especialmente contrário às ciências sociais e humanidades (artes, literatura, etc.). Precisa destruir a história para a construção de uma falsa narrativa onde os torturadores e homicidas são heróis.
A violenta e moralmente duvidosa colaboração premiada vai ganhar uma nova parceira de tortura: a autoincriminação, clara violação da Convenção de San José da Costa Rica (proibição da produção de provas contra si mesmo) e do princípio do devido processo legal, consagrado tanto pela Constituição/1988 como pela Declaração de Direitos Humanos das Nações Unidas.
Em todos os países onde o método da autoincriminação foi utilizado, demonstrou-se um fracasso processual e ético, além de porta aberta para abuso de poder e tortura. Afinal, o que é preferível, ficar preso cautelarmente durante vários dias ou assumir a culpa e uma pena restritiva de direitos que não lhe impedirá de trabalhar, mesmo sendo inocente?
A autoincriminação é uma forma de estigma, assim como a criação de bancos de dados genéticos criminais de pessoas que sequer foram julgadas pela justiça. A simples prisão(especialmente se considerarmos que 40% dos presidiários brasileiros estão presos ilegalmente), não legitima o registro criminal de uma pessoa, pois todos são inocentes até que se prove o contrário. Logo, a apreensão de dados genéticos e pessoais em bancos de dados criminais é uma violação dos direitos constitucionais à liberdade, à honra e à intimidade.
Por fim, e não poderia ser diferente, além de legitimar mortes cometidas pelo estado e abuso de poder, Sérgio Moro tenta validar os seus próprios erros. Prova mais evidente do reconhecimento da ilegalidade de 25% das prisões que compõem o nosso sistema carcerário é a tentativa de restringir por lei a validade de dois recursos que são constitucionais: o especial e o extraordinário.
Estamos tratando das prisões ilegais de pessoas condenadas em segunda instância com pendência recursal. A proposta carece de base constitucional, assim como aquela que permite a retroatividade da lei penal. Nem Himmler foi tão longe na sua sanha pela eliminação de adversários políticos, ideológicos ou raciais. As leis nazistas criaram a estigmatização de pessoas, mas não limitaram o devido processo legal. Para isto, se utilizavam de sentenças fraudulentas em tribunais de exceção. Moro tenta ir mais longe, tentando legalizar os seus próprios abusos.

segunda-feira, 22 de julho de 2019

A Perversão eleita por perversos

Escondido e minimizado na eleição, lado "real" de Bolsonaro ressurge com força

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O presidente Jair Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro

“Faz muito tempo”, “ele não pensa mais assim” e “não é de coração” foram, provavelmente, as frases mais repetidas pelos brasileiros entre setembro e novembro de 2018.

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Naquele momento, a conversa começava a se desenhar em gráficos de pesquisas eleitorais que indicavam a vitória, nas urnas, de um dos mais perversos personagens já paridos pela política nacional.
Em tempos de avalanche de informação e desencanto com o mundo real, que catapultou e produziu também desinformações em velocidade inédita pelas redes, essa perversidade passou a ser interpretada como coragem para enfrentar problemas sobre os quais Jair Bolsonaro jamais se debruçou com seriedade em três décadas de carreira política, sobretudo a questão da segurança pública.

Leia mais no blog do Matheus Pichonelli


Às vésperas da posse, um motorista de Uber me justificava o voto com uma grande esperança: “o velho Bolsonaro era um personagem pra chamar a atenção. Pode anotar aí: assim que ele assumir, vai ser outra pessoa. Vai se comportar como presidente e parar de graça”.
A fala era recorrente. Do meu circulo de relacionamento, muita gente dizia votar no capitão APESAR de seu histórico até então classificado como “polêmico”, e não POR CAUSA desse histórico.
Não que não houvesse, como há, entusiastas da versão mais furiosa do personagem. Em um país mediado por exclusões e preconceitos, era clara a identificação de certos grupos com o discurso bolsonarista, como a defesa do armamento da população e o desprezo, mal disfarçado, sobre feministas, movimentos negros, população LGBT e quem quer que discordasse de sua visão torta da realidade, automaticamente associada ao lado de lá da cortina de ferro derrubada em 1989.
Mas só o apoio desse grupo não era suficiente para ganhar a eleição. Era preciso convencer os eleitores de centro - avessos, cansados ou empobrecidos pela crise econômica iniciada no governo Dilma - de que a projeção do poder traria também noções básicas de respeito ao cargo que aquele candidato “polêmico” ocuparia em breve. Isso exigiria uma capacidade de convívio com o contraditório e um espírito republicano que ele jamais havia demonstrado na vida púbica. Não custava torcer, diziam os esperançosos.
Já de olho nas eleições, uma das últimas aparições do Bolsonaro-raiz aconteceu em 2017, quando discursou no clube Hebraica, no Rio de Janeiro. Entre outras pérolas, o então deputado disse que o Brasil não poderia “abrir as portas para todo mundo” e questionou: “Alguém já viu algum japonês pedindo esmola? É uma raça que tem vergonha na cara!”.
No auge da campanha, quando as chances de vitória eram palpáveis, entrou em cena um candidato mais discreto e avesso à verborragia. Que não só evitava divididas como censurava o candidato a vice, general Mourão, quando entrava em temas polêmicos.
O atentado a faca, em Juiz de Fora, no auge da campanha, deu a Bolsonaro uma trégua na demonização desenhada por adversários (Geraldo Alckmin, do PSDB, puxava a fila) e o impediu de participar de debates. Em um deles, pré-atentado, ele havia tomado uma lambada de Marina Silva (Rede) ao se meter num assunto que diz conhecer: religião.
O fato é que, durante boa parte da eleição, o Bolsonaro real ficou de escanteio, por oportunismo ou pelas condições atípicas da disputa.
De alguma forma, ele parecia ser o postulante adequado para a disrupção exigida pelos eleitores por supostamente ser diferente de todos - essa distância, na verdade, era só a desfaçatez de quem desancava, para delírio da plateia, a classe política da qual fazia parte havia três décadas.
Eleito, recuperado, confiante e com moral após da reforma da Previdência, uma das poucas condições impostas pelos investidores em seu apoio, Bolsonaro voltou a se comportar, dez meses depois, como o deputado do baixo clero que profere barbaridades como quem faz piada em velório. Virou o que boa parte dos eleitores temia ou se negava a temer: um touro na loja de cristais.
Na última semana, ele engatou um sprint e produziu barbaridades que sequer os mais notáveis opositores tiveram tempo de assimilar, reproduzir, comentar.
Em poucas horas, ele se referiu aos governadores do Nordeste como “paraíbas” e declarou que “o pior deles” era Flávio Dino, do Maranhão. (Depois tentou se justificar, mas o remendo, com outra grosseria sobre a repórter que lhe questionara, saiu pior que o estrago: “Pelo amor de Deus, né. Se eu te chamar de feia agora, acabou o mundo. Todas as mulheres vão estar contra mim”).
Ele disse que era uma piada dizer que alguém passa fome no Brasil, defendeu o fim da multa de 40% sobre FGTS em caso de demissão do trabalhador sem justa causa, mas negou que haja um projeto, somente um estudo, sobre o assunto.
Também disse que quer beneficiar o filho, sim, ao comentar a chance de nomear Eduardo Bolsonaro embaixador nos EUA, agrediu gratuitamente os produtores do filme “Bruna Surfistinha” e flertou com a censura ao dizer que se a agência nacional de cinema não puder ter filtro, será extinta ou privatizada.
Como se fosse pouco, ele decidiu caluniar uma das mais respeitadas jornalistas do país, inventando a história de que Miriam Leitão queria aderir à guerrilha do Araguaia para implantar uma ditadura esquerdista no Brasil, e ouviu um sermão da TV Globo em rede nacional.
Por fim, contestou dados de desmatamento registrados pelo Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que estaria “a serviço de algumas ONGs”.
As respostas do presidente do instituto, Ricardo Magnus Osório Galvão, são dignas de quem tem alguma visão aérea sobre a devastação mental por que passa o Brasil: "Ao fazer acusações sobre os dados do Inpe, na verdade ele faz em duas partes. Na primeira, ele me acusa de estar a serviço de uma ONG internacional. Ele já disse que os dados do Inpe não estavam corretos segundo a avaliação dele, como se ele tivesse qualidade ou qualificação de fazer análise de dados".
“Ele tomou uma atitude pusilânime, covarde, de fazer uma declaração em público talvez esperando que peça demissão, mas eu não vou fazer isso.”
Para Galvão, Bolsonaro tem tido um comportamento típico de um garoto de 14 anos demonstra não respeitar “a dignidade e liturgia da Presidência”.
A análise é compartilhada pelos eleitores ouvidos pelo Datafolha no começo do mês. Apenas 22% acreditam que Bolsonaro age como um presidente deveria se comportar. Um em cada quatro entrevistados dizem o contrário.
Mais: para 4 em cada 10 brasileiros, ele não fez nada de muito positivo ou que mereça destaque em seus seis meses de governo.
Querendo ou não, o presidente do Inpe vocacionou o que os institutos de pesquisa começam a apontar - e explicou as razões. Em poucas palavras, Bolsonaro foi chamado de ignorante, covarde e pusilânime por um servidor que se tornou alvo de sua verborragia – tudo isso poucos dias antes de vazar a conversa de procuradores da Lava Jato sobre como ficaria o discurso anticorrupção de Sergio Moro após a descoberta de que esse discurso poderia acertar o filho do chefe e o próprio chefe.
Como resumiu o jornalista Leandro Beguoci, em sua conta no Twitter, Bolsonaro não quer presidir o Brasil. Ele quer presidir uma versão que ele criou do país. “Nesta versão, não tem fome, nepotismo é liberado, floresta é pra cortar e os maiores problemas nacionais são as propagandas do BB, o filme da Bruna Surfistinha e a tomada.”
A realidade paralela de Bolsonaro é parte do pacote da versão real do presidente que, escondida nas eleições, agora não vem a público mostrar que é o que sempre foi.