Especialistas destacam a gestão de
dados, o ensino por competências e as novas formas para avaliar e
certificar como alvo das atenções
É cada vez mais comum encontrar plataformas tecnológicas – e
atrativas – para promover aprendizado, jogos que imediatamente elaboram
rankings da classe ou ferramentas que geram relatórios com desempenho de
alunos. Mas professores ainda sentem falta de um norte que apoie e
fomente estratégias para impulsionar o desempenho de alunos.
Especialistas ouvidos pelo
Porvir consideram que 2015 pode
começar a mudar esse quadro e veem como tendências que estarão no centro
do debate educacional a adoção de plataformas de gestão de dados, o
aprendizado baseado em competências e as novas formas de avaliar e de
certificar conhecimentos. É por meio deste pacote inovador, segundo
eles, que se conseguirá fomentar o empreendedorismo, a consciência e
competências para resolver problemas urgentes relacionados à
sustentabilidade e desenvolver as habilidades do século 21.
Leia também: Especial personalização – como colocar o aluno no centro
Tudo começa com o enfrentamento de dois grandes desafios: a garantia
de conectividade plena, que permitirá acesso a recursos multimídia de
maneira eficiente, e uma formação de professores que os prepare para
inovar e lidar com ferramentas digitais.
Outra questão a caminho de ser resolvida é a fragmentação do
ecossistema de tecnologias educacionais. Assim como acontece no mundo do
entretenimento e dos sistemas operacionais de celulares, o impacto da
tecnologia trouxe claros benefícios, mas gerou uma quantidade enorme de
dados (
big data )
de aplicações — que nem sempre conversam entre si –, como jogos,
plataformas adaptativas e aplicativos usados dentro ou fora da sala de
aula. Por isso, Michael Horn, cofundador e diretor-executivo do
Clayton Christensen Institute,
vê o setor caminhando para a adoção de ambientes integradores
conhecidos como LRM (sigla em inglês para programas de computador de
gestão de aprendizado). “Eles são similares aos CRM [acrônimo também em
inglês para ferramentas de gestão de relacionamento com o cliente, muito
presentes em setores como o comércio] e surgem como uma nova categoria
de ferramentas que tornarão mais produtivos os ensinos online, híbrido e
por competências, além do desmembramento dos cursos universitários”,
diz.
“Essa tendência de LRMs crescerá rapidamente na
educação superior em 2015, sendo seguida pelo ensino corporativo e,
depois, pela educação básica”
Horn coloca como pioneiras neste nicho empresas americanas como a
Fidelis Education (onde ele também é um dos executivos) e a
Motivis Learning, nascida a partir da
College for America, uma iniciativa online da
Southern New Hampshire University,
que se dedica a ensinar e certificar competências através de projetos
realizados totalmente à distância. “Essa tendência de LRMs crescerá
rapidamente na educação superior em 2015, sendo seguida pelo ensino
corporativo e, depois, pela educação básica nos próximos anos”, explica.
Este tipo de solução tecnológica também surge para tratar de um
problema ligado à maneira com que o professor e líderes educacionais
devem interagir com os dados. Se apenas o “dado útil” fosse coletado,
seria mais fácil para tomar iniciativa, perceber falhas e corrigir o
caminho de cada estudante. Mas isso não é tão simples, como explica o
professor Alex Bowers, do
Teachers College, da
Universidade de Columbia,
nos Estados Unidos. “Mais dados não geram melhor desempenho, da mesma
maneira que dirigir por um caminho mais longo não implica diretamente em
uma melhora do caminho até o trabalho”, compara.
Novas formas de avaliar e certificar
“Mais e mais países começam a entender as
características e competências que jovens precisam para sobreviver e ser
bem-sucedidos no século 21″
Ao longo do ano, os testes padronizados que formam rankings e que
tanto preocupam gestores e políticos, também devem ocupar o centro da
arena de debate e sofrer questionamento maior. David Albury, consultor
independente de educação e diretor do
Innovation Unit, instituição parceira do
Porvir,
chega a falar até em “desilusão” com este tipo de método para avaliar
desempenho escolar. “Mais e mais países começam a entender as
características e competências que jovens precisam para sobreviver e ser
bem-sucedidos no século 21, como tomar iniciativa, criatividade,
resolução de problemas de forma colaborativa, etc”, diz Albury.
Uma das receitas para alcançar esse aprendizado mais profundo, que dê
conta das competências inter e intrapessoais, é novamente o uso da
tecnologia e o olhar criterioso para os dados. Em
recente estudo do grupo editorial
Pearson publicado pelo
Porvir,
os consultores Michael Barber e Peter Hill preveem uma “revolução” que
tirará o professor do trabalho repetitivo e permitirá testes
personalizados. “No lugar dos cumulativos, é possível realizar apenas
aqueles com propósito específico [com possibilidade de repetição] e
proporcionar relatórios que incentivam o crescimento sem a ideia de
sucesso ou fracasso”, diz o documento.
As avaliações personalizadas ainda facilitam uma mudança que permeia
todo o processo de aprendizado, que deixa de ser guiado pelo tempo e
passa a ser baseado em competências. Métodos como o ensino baseado na
resolução de problemas e o uso elementos do mundo dos jogos são algumas
das formas de concectar aprendizados com o mundo real. No Brasil,
segundo Adriana Martinelli, consultora em educação e sócia-fundadora do
LED (Laboratório de Experimentações Didáticas), será um ano importante para a expansão dos
FabLabs , laboratórios integrados para aprendizado que combinam física, química com robótica e programação.
Leia também: Especial socioemocionais – como preparar alunos para o século 21
Com novas formas de ensinar e avaliar, a maneira de atestar
conhecimento também é impactada e começa a ficar mais flexível, se
adaptando aos conteúdos e à duração. Assim, surgem os nanocertificados
(ou nanodegrees, em inglês), que oferecem apenas algumas áreas de cursos
tradicionais, como o
MBA, para o estudante se concentrar. Parece distante? A
Udacity, empresa gestada na
Universidade de Stanford, nos EUA, já oferece modelos de cursos assim que podem ser feitos online (e de qualquer lugar do mundo). A
Fundação Mozilla, por meio do
openbadges.org,
também aposta na tendência de desmembramento dos cursos universitários
e, junto a instituições como museus e centros de pesquisa, oferece
badges
(condecorações) online para atestar o domínio de uma determinada área
de programação, por exemplo. Apesar de inovadoras, essas formas
diferentes de chancelar o domínio sobre determinado assunto ainda
enfrentam um grande desafio: convencer empregadores. “O ano de 2015 terá
uma maior atividade de formas alternativas de certificação atuando
sobre o mercado de trabalho, mas sua aceitação acontecerá em um ritmo
menor do que a esperada pelas pessoas”, diz Michael Horn, do Clayton
Christensen Institute.
“Tenho o sonho de que o nanodregree aterrisse no
Brasil trazendo características muito parecidas com a residência, no
curso medicina”
“Tenho o sonho de que o nanodregree aterrisse no Brasil trazendo
características muito parecidas com a residência, no curso medicina. É
muito ligado à prática, dura entre seis meses e um ano, e você sai um
especialista. Com ele, você dá ao aluno a chance de customizar a
aprendizagem”, diz a consultora Adriana Martinelli. A expansão desta
modalidade no Brasil também esbarra na lei que, dentre outros
requisitos, exige 360 horas de aulas. “Por causa de regulamentação do
MEC, por enquanto é possível criar cursos como esses de caráter livre, mas não como especialização”, diz.
Uma formação que conecta o indivíduo à realidade além do muro da
escola, com competências específicas para resolver problemas, também
propicia uma nova visão a respeito do empreendedorismo. “Um negócio
bem-sucedido precisa atacar um grande problema para que as pessoas se
interessem pelo produto. Olhando para coisas concretas, tecnologias para
otimizar e reusar água vão abrir janelas de oportunidades para soluções
que devem ser produzidas rapidamente, porque estamos falando de
questões [como a falta de água] que atingem as maiores regiões
metropolitanas do país”, diz Paulo Lemos, professor universitário e
pesquisador da
Unicamp.
Os eventuais obstáculos para o desenvolvimento de novos negócios, de
acordo com Lemos, servirão para mudar o viés “festivo” do ambiente de
startups: “Muitas pessoas entram na onda até tomarem consciência que
empreender não é sua praia, e que traz dificuldades. Até lá, novos
negócios vão surgir e outros desaparecer para que a economia retome o
crescimento”.
Veja como resumimos as tendências no infográfico abaixo: