Alberto Villas
Se você acha que café com leite é só a bebida mais comum do mundo no café da manhã, ou que babado serve apenas para enfeitar a saia, é porque ainda não leu o Pequeno dicionário brasileiro da língua morta, do jornalista Alberto Villas.
E por que
o jornalista garimpou tantas palavras que caíram em desuso? Para mostrar como a
língua portuguesa tem um rico vocabulário e sofre mutações ininterruptamente?
Talvez. Essa é uma possibilidade. Mas, para Max Gehringer, que assina uma das
orelhas do livro, “o que o Villas fez foi garimpar palavras por puro deleite,
como quem encontra um empoeirado disco de vinil da Jovem Guarda (‘Meu Broto’,
com Teddy Milton) e aí embarca numa nostálgica viagem no tempo”.
Durante
essa viagem, Villas foi escarafunchando seu baú de memórias e desencavou
palavras divertidas, como xumbrega. “Diz a lenda que essa palavra tem origem lá
por volta de 1600, quando o aventureiro alemão Friedrich Hermann Schönberg, que
comandava as tropas de Portugal contra a Espanha, se deu mal. Schönberg acabou
virando xumbrega. E xumbrega quer dizer uma coisa ruim, feia, mal-acabada.”
O
abecedário formulado por Villas traz algumas milongas (mexericos), mas nada que
faça corar sirigaitas (mulheres ousadas, atrevidas) ou mancebos (rapaz novo,
que hoje seria o correspondente a “gato”). Pode ser que fãs do cantor Fagner
fiquem chateados ao saber que o autor do livro acha a voz dele igual à de
taquara rachada: “É só ouvir o primeiro disco dele – ‘Manera Fru Fru Manera’ –
ou o segundo, ‘Ave Noturna’. Não que o autor de ‘Mucuripe’ tenha uma voz
irritante, mas é muito particular, de taquara rachada”. Mas, para livrar um
pouco a barra dele, Villas complementa: “A Desciclopédia tem uma lista enorme
de pessoas com voz de taquara rachada. De Tiririca a Xuxa, passando por Sandy
Leah, a Sandy do Júnior”.
Exemplos de palavras hilárias pululam no livro. Como manota, aquele fora que, por mais que se queira, não há como remediar: você chega para uma mulher, olha a barriguinha dela e pergunta: “É pra quando?”. E ouve a resposta: “Não estou grávida!”. Que mancada! Ou que quiproquó! Se você tem vontade de engrossar seu vocabulário, e quer fazer bonito com os seus amigos, pode adotar daqui para frente fuzarca, víspora, palangana. Esse é o melhor jeito de lavar a égua.
O
autor
Alberto
Villas nasceu em Belo Horizonte em 1950. Jornalista e escritor, em 2006 lançou
o seu primeiro livro, O mundo
acabou! que ficou várias
semanas nas listas dos mais vendidos. Em seguida lançou Afinal, o que viemos fazer em
Paris?, Admirável mundo
velho! e Onde foi parar nosso tempo?,
todos pela Globo Livros.
Walcyr Carrasco
http://colunas.revistaepoca.globo.com/walcyrcarrasco
Alberto Villas: saudade de palavras perdidas
Alberto Villas: saudade de palavras perdidas
19:29, 29 DE ABRIL DE 2012
WALCYR CARRASCO
O jornalista Alberto Villas publicou um livro delicioso: “Pequeno
Dicionário da Língua Morta”.
É sobre palavras que sumiram do mapa. Mas que gente como eu, já nos 60,
ainda as usa de vez em quando, revelando sem querer, a idade.
Fuzarca é uma delas. Os reis da “Fuzarca”eram aqueles rapazes que faziam
farras. Mas havia um traço de ingenuidade nos tempos da fuzarca. Era uma farra,
mas não como as de hoje, muito mais pesadas. A Fuzarca saiu de moda. Virou
Farra, simplesmente. E a tal ingenuidade saiu de moda mais depressa ainda.
Macaca era a fã alucinada, capaz de loucuras para conseguir um fio de
cabelo de Cauby Peixoto ou um pedaço da roupa rasgada de Angela Maria. As
antigas macacas de auditório hoje são vovós. E a fã alucinada virou Tiete.
Sapeca era a criança agitada, que não parava quieta. Mocinha sapeca era
mais além, usava minissaia, era meio safadinha. A palavra sapeca saiu de moda.
As garotas não. Meninos e rapazes continuam adorando as sapecas.
Lambuja. Alguém comprava um sapato e ganhava uma meia de lambuja. Ou
enchia o tanque e ganhava uma ducha. Lambuja era o algo mais. Que agora
chamamos de bônus. Não vou negar, é mais chique.
Fura-bolo — No passado os dedos tinham nomes e funções. Havia o
mata-piolhos e também o fura-bolo. Teoricamente, era com ele que a criança
experimentava o bolo, embora eu nunca tenha conhecido alguém que deixasse os
filhos botarem o dedo no bolo quentinho. Hoje os dedos perderam esses nomes
divertidos. Mesmo porque não conheço também ninguém que mate piolhos com
o dedo. Ou que confesse isso.
Achei o livro divertidíssimo. E para quem gosta de escrever novelas de
época como eu, é bom guardar na estante, para usar na primeira oportunidade!