sexta-feira, 16 de maio de 2014

Os professores somos realmente coitadinhos, estropiados e maltratados?



Os professores somos realmente coitadinhos, estropiados e maltratados?
Romério Gaspar Schrammel Professor Português/Ensino Médio na Colégio Evangélico Alberto Torres Principal contribuidor
Normalmente escrevo esta coluna pensando nos leitores que nada têm a ver com o setor educacional. Faço isso, em primeiro lugar, porque creio que a educação brasileira só vai avançar (e com ela o Brasil) quando houver demanda pública por melhorias. E,...

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PROFESSORES, ACORDEM!

12/05/2014 22:18
Normalmente escrevo esta coluna pensando nos leitores que nada têm a ver com o setor educacional. Faço isso, em primeiro lugar, porque creio que a educação brasileira só vai avançar (e com ela o Brasil) quando houver demanda pública por melhorias. E, segundo, porque nos últimos anos tenho chegado à conclusão de que falar com o professor médio brasileiro, na esperança de trazer algum conhecimento que o leve a melhorar seu desempenho, é mais inútil do que o proverbial pente para careca. Não deve haver, nos 510 milhões de quilômetros quadrados deste nosso planeta solitário, um grupo mais obstinado em ignorar a realidade que o dos professores brasileiros. O discurso é sempre o mesmo: o professor é um herói, um sacerdote abnegado da construção de um mundo melhor, mal pago, desvalorizado, abandonado pela sociedade e pelos governantes, que faz o melhor possível com o pouco que recebe. Hoje faço minha última tentativa de falar aos nossos mestres. E, dado o grau de autoengano em que vivem, eu o farei sem firulas.
Caros professores: vocês se meteram em uma enrascada. Há décadas, as lideranças de vocês vêm construindo um discurso de vitimização. A imagem que vocês vendem não é a de profissionais competentes e comprometidos, mas a de coitadinhos, estropiados e maltratados. E vocês venceram: a população brasileira está do seu lado, comprou essa imagem (nada seduz mais a alma brasileira do que um coitado, afinal). Quando vocês fazem greve — mesmo a mais disparatada e interminável —, os pais de alunos não ficam bravos por pagar impostos a profissionais que deixam seus filhos na mão; pelo contrário, apoiam a causa de vocês. É uma vitória quase inacreditável. Mas prestem atenção: essa é uma vitória de Pirro. Porque nos últimos anos essa imagem de desalento fez com que aumentassem muito os recursos que vão para vocês, sem a exigência de alguma contrapartida da sua parte. Recentemente destinamos os royalties do pré-sal a vocês, e, em breve, quando o Plano Nacional de Educação que transita no Congresso for aprovado, seremos o único país do mundo, exceto Cuba, em que se gastam 10% do PIB em educação (aos filocubanos, saibam que o salário de um professor lá é de aproximadamente 28 dólares por mês. Isso mesmo, 28 dólares. Os 10% cubanos se devem à falta de PIB, não a um volume de investimento significativo).
Quando um custo é pequeno, ninguém se importa muito com o resultado. Quando as coisas vão bem, ninguém fica muito preocupado em cortar despesas. E, quando a área é de pouca importância, a pressão pelo desempenho é pequena. No passado recente, tudo isso era verdade sobre a educação brasileira. Éramos um país agrícola em um mundo industrial; a qualificação de nossa gente não era um elemento indispensável e o país crescia bem. Mas isso mudou. O tempo das vacas gordas já era, e a educação passou a ser prioridade inadiável na era do conhecimento. Nesse cenário, a chance de que se continue atirando dinheiro no sistema educacional sem haver nenhuma melhora, a longo prazo, é zero.
Vocês foram gananciosos demais. Os 10% do PIB e os royalties do pré-sal serão a danação de vocês. Porque, quando essa enxurrada de dinheiro começar a entrar e nossa educação continuar um desastre, até os pais de alunos de escola pública vão entender o que hoje só os estudiosos da área sabem: que não há relação entre valor investido em educação — entre eles o salário de professor — e o aprendizado dos alunos. Aí esses pais, e a mídia, vão finalmente querer entrar nas escolas para entender como é possível investirmos tanto e colhermos tão pouco. Vão descobrir que a escola brasileira é uma farsa, um depósito de crianças. Verão a quantidade abismal de professores que faltam ao trabalho, que não prescrevem nem corrigem dever de casa, que passam o tempo de aula lendo jornal ou em rede social ou, no melhor dos casos, enchendo o quadro-negro de conteúdo para aluno copiar, como se isso fosse aula. E então vocês serão cobrados. Muito cobrados. Mas, como terão passado décadas apenas pedindo mais, em vez de buscar qualificação, não conseguirão entregar.
Quando isso acontecer, não esperem a ajuda dos atuais defensores de vocês, como políticos de esquerda, dirigentes de ONGs da área e alguns “intelectuais”. Sei que em declarações públicas esse pessoal faz juras de amor a vocês. Mas, quando as luzes se apagam e as câmeras param de filmar, eles dizem cobras e lagartos.
Existem muitas coisas que vocês precisarão fazer, na prática, para melhorar a qualidade do ensino, e sobre elas já discorri em alguns livros e artigos aqui. Antes delas, seria bom começarem a remover as barreiras mentais que geram um discurso ilógico e atravancam o progresso. Primeira: se vocês são vítimas que não têm culpa de nada, também não poderão ser os protagonistas que terão responsabilidade pelo sucesso. Se são objetos do processo quando ele dá errado, não poderão ser sujeitos quando ele começar a dar certo. Se vocês querem ser importantes na vitória, precisam assimilar o seu papel na derrota.
Segunda: vocês não podem menosprezar a ciência e os achados da literatura empírica sempre que, como na questão dos salários, eles forem contrários aos interesses de vocês. Ou vocês acreditam em ciência, ou não acreditam. E, se não acreditam — se o que vale é experiência pessoal ou achismo —, então vocês são absolutamente dispensáveis, e podemos escolher na rua qualquer pessoa dotada de bom-senso para cuidar da nossa educação. Vocês são os guardiães e retransmissores do conhecimento acumulado ao longo da história da humanidade. Menosprezar ou relativizar esse conhecimento é cavar a própria cova.
Terceira: parem de vedar a participação de terceiros no debate educacional. É inconsistente com o que vocês mesmos dizem: que o problema da educação brasileira é de falta de envolvimento da sociedade. Quando a sociedade quer participar, vocês precisam encorajá-la, não dizer que só quem vive a rotina de “cuspe e giz” é que pode opinar. Até porque, se cada área só puder ser discutida por quem a pratica, vocês terão de deixar a determinação de salários e investimentos nas mãos de economistas. Acho que não gostarão do resultado...
Quarta: abandonem essa obsessão por salários. Ela está impedindo que vocês vejam todos os outros problemas — seus e dos outros. O discurso sobre salários é inconsistente. Se o aumento de salário melhorar o desempenho, significa que ou vocês estavam desmotivados (o que não casa com o discurso de abnegados tirando leite de pedra) ou que é preciso atrair pessoas de outro perfil para a profissão (o que equivale a dizer que vocês são inúteis irrecuperáveis).
O respeito da sociedade não virá quando vocês tiverem um contracheque mais gordo. Virá se vocês começarem a notar suas próprias carências e lutarem para saná-las, dando ao país o que esperamos de vocês: educação de qualidade para nossos filhos. Gustavo Ioschpe - Revista Veja - 11/05/2014 - São Paulo, SP/lido em 12/05/2014 em< clipping educacional clipping@editau.com.br

Comentários
9 comentários
Maria Asuncion
professora de matemática na Prefeitura municipal de Salvador
De fato a demenda pública ajudaria muito,contudo temos que pensar.Semana passada fizemos uma reunião de pais e os convidamos para irem a sala dos filhos.Na sala um professor falou em cantar o hino nacional,uma mãe se levantou e disse:não quero minha filha cantando hino ele não é gado.Se dirigiu a filha e falou se colocarem você para cantar hino não cante.
Resumindo todos sabem da importancia da educação mas nem todos sabem como se faz para educar.
Mirtha Lizandra R. gostou disto.
WAGNER
diretor na secretaria da educação
Professor, bom dia.
Concordo que não somos uns coitadinhos. Que temos a faca e o queijo nas mãos, porém não sabemos usar. Precisamos sim da ajuda dos pais para melhorar o ensino público para quem mais precisa dele.
Nas escolas públicas das periferias realizamos quase de tudo: ensino, comportamento, saúde e higiene, inclusive bucal, cidadania, eleição... e não enumerar todos os serviços, inclusive limpar aluno.Isso porque a carência é tanta que se não realizarmos estas tarefas não conseguimos concretizar nossa tarefa, que é o de ensinar e ensinar com qualidade, apesar de salas lotadas e sem infra estrutura adequada.
Aí deparamos com políticas educacionais desastrosas, principalmente no Estado de São Paulo que é o mais rico da federação que nos incentiva com bônus e não com salário.
Precisamos, sim, professor de ótimos salários, de condições dignas de trabalho como consta no nosso Estatuto e não é respeitado. Precisamos de segurança para implantar nas escolas um espaço adequado de educar, com garantias que poderemos voltar para casa com segurança.
Renata N. gostou disto.
Ivan
Presidente do Instituto Interactor-Cyber RV; Voluntário na Forum de Transformação e Movimento Cidadão
Caro Romério
Caros Maria e Wagner
Excelentes artigo e comentários. Com pequenas divergências.

Após 40 anos de magistério, recebendo desde R$400,00 por mes (durante 4 anos) de uma faculdade de boa avaliação, até US$600,00 por hora de corporações para 1 mes de trabalho, agora acrescidos de 8 anos de voluntariado no segundo grau, percorri quase todos os segmentos da educação. Estou aposentado com "gorda" seguridade pública de R$765,00 reais por mes. Apenas 40 vezes menor que a de um Juiz. E modesta "aposentadoria privada" potencialmente variável entre R$2.000,00 a R$6.000,00 por mes, constituída de poupanças investidas. Posso me considerar, na média, um professor feliz.

Se não tivesse poupado, investido e praticado pequenos negócios em economia familiar por 40 anos, estaria passando fome hoje.

Concordo com a visão de pequenez das lideranças educacionais. Sindicatos e Governo. Não acho que os problemas levantados esgotem o tema. O buraco pode ser bem mais em baixo. E não há sinal de solução endógena. Podem investir o dobro e dobrar salários que vai continuar do mesmo jeito. A questão é cultural. Como bem definido, a "cultura do coitadinho". Mesmo sendo o segmento que "engole" uma das maiores proporções do PIB em investimento.

Tenho por mim que a Educação vai ser o último da fila a ser inserido na Era do Conhecimento. O que é contraditório e ridículo.

Começo a me convencer de que o Sistema Educacional vai apodrecer por dentro até desaparecer. Levando consigo Sindicatos pelêgos e Governos incompetentes. Enquanto vai sendo comido, muito lentamente, pelas beiradas, através da Tecnologia da Informação e Comunicação. Quando os professores acordarem, o chamado Sistema Educacional não vai mais existir. Foi. Ou vai ser substituído.

O que vai existir no lugar?
Os que pagarem para ver, vão sair na frente.
Com as NetAulas mostrando que o custo de 30 professores de uma pequena escola serão o dobro do preço de manutenção de uma equipe moderna. E que o miserável piso salarial ora reinvidicado como solução, vai ser 1/3 do salário do professor moderno.

E a "cola"? Vcs sabem o que é a cola?
Em ICT são os burocratas inúteis que incham as folhas de pagamento sem agregar valor ao produto. Devem consumir mais que o salário somado de TODOS OS PROFESSORES do país.
A eliminação da "cola" vai ser um ganho da sociedade. Seja para reduzir o custo educacional. Seja para melhorar ainda mais a condição das escolas e professores remanescentes. Sendo o saldo investido em pesquisa e desenvolvimento.
Dentro ou fora do sistema de ensino.

É o modesto esboço de minha visão de futuro.
O Véio.
Renata N. gostou disto.
WAGNER
diretor na secretaria da educação
Prof Ivan, tudo bem?

Adorei suas colocações, pois é bem por aí mesmo, bem legítimas.
Não sou contra a Copa de futebol no Brasil, porém, foram investidos muitos recursos, estatal e privados, pois vai gerar lucro imediato, porém a boa educação gera lucros futuros muito melhor e eficaz para nossa população.
Meu medo agora é a aprovação do PDE e dos 10% do PIB para a educação. Onde vai parar esse dinheiro? Será que vai chegar na sala de aula, na merenda do aluno, no bolso do professor?
Ivan K. gostou disto.
Suely
Técnico Administrativo em Educação
Não sou professora, sou mãe hoje de dois adultos que quando crianças e adolescentes já precisaram estudar num colégio público. Me preocupo sim com a educação no nosso país. Concordo em parte com o texto do Sr. Romerio, sei que muitos professores são aquém realmente do que esperamos deles, mas também sei que em muitas escolas não são dadas infraestrutura adequadas para receberem seus alunos. Escolas com banheiros quebrados, ventiladores que mal funcionam no calor de 40 graus, onde deveriam ter ar condicionados, torneiras que não funcionam, tetos caindo, buracos, etc. Além disso deparamos com a falta de professores em certas disciplinas, que com certeza não se sentem atraidos pelos "grandes" salários. Falta de comunicação com os pais, falta de profissionais adequados para fazerem essa comunicação. Precisamos de gente qualificada para trabalharem nas escolas e para gente qualificadas tem que se oferecer atrativos como bons salários, beneficios, ambientes saudáveis e seguros. A partir do momento que você oferece isso, você pode e deve cobrar a contrapartida. Só assim poderemos ter uma educação de qualidade. Com toda sociedade fazendo a sua parte. Governo, pais, professores, profissionais e alunos.
Ivan
Presidente do Instituto Interactor-Cyber RV; Voluntário na Forum de Transformação e Movimento Cidadão
Tudo bem Wagner
Vc explanou bem. Mas eu acho que prevalecerá a estatística da ONU sobre Assistência Social. A cada 5 dólares investidos, apenas 1 chega ao usuário final. O resto vasa no caminho, e como diz Suely gera os buracos, tetos caindo, banheiros quebrados, etc.

Apenas fico me perguntando. O que nasceu primeiro? O ovo ou a galinha?
Em minha juventude nos perguntávamos.
Vamos trabalhar bem e exigir remuneração compatível?
Ou vamos esperar remuneração compatível para trabalhar bem?

Eu optei pela primeira. E o patrão que não me remunerou bem, eu demitia.
Será que tomei a opção errada?
Sei lá. Não sou rico mas estou feliz.
E vivendo modestamente bem.
Mirtha Lizandra
Coordenadora
O certo é que a educação precisa de elementos efetivos na sua prática.Até porque evoluir é sinal que nossa geração precisa estabelecer subsídios de ações na nossa cultura e valorizar o docente em sua real presença de transformação da sociedade e assim conquistar o respeito e reconhecimento da arma que dispomos nessa luta:"A educação de qualidade".
Ivan K. gostou disto.
WAGNER
diretor na secretaria da educação
Oi Ivan, tudo bem?

Gostei quando disse que mandou o patrão embora. Mas não consigo, sou obrigado a continuar com este e acho que vou aposentar com eles.
Mas gostei da idéia.
Ivan K. gostou disto.
Ivan
Presidente do Instituto Interactor-Cyber RV; Voluntário na Forum de Transformação e Movimento Cidadão
Patrão ruim é igual cônjuge safado.
Tem que levar pé na bunda.
Ou então
Mete chifre nele. kkkkk