sexta-feira, 16 de maio de 2014

A falsa politização em massa


A falsa politização em massa e a permanência de muitos vícios cidadãos http://ow.ly/2GOJ6n
A falsa politização em massa e a permanência de muitos vícios cidadãos
Reacionários formadores de opinião estão tentando cooptar os corações indignados de milhões de brasileiros e canalizar seus anseios de modo que atendam a interesses políticos nada transformadores.
Reacionários formadores de opinião estão tentando cooptar os corações indignados de milhões de brasileiros e canalizar seus anseios de modo que atendam a interesses políticos nada transformadores.
A assustadoramente meteórica ascensão da página TV Revolta no Facebook nessa semana nos deu uma ideia do estado atual da consciência política de grande parte dos brasileiros que se dizem inconformados com os desmandos políticos e maus serviços públicos no Brasil. E esse estado, ao contrário do que os mais românticos pensavam na segunda metade de junho de 2013, não é animador. Isso porque está claro que essa multidão ainda não dominou a arte de discutir maduramente política e participação democrática popular.
Houve um entusiasmo quase generalizado com a experiência dos protestos de junho de 2013, que foram horizontalizados, sem lideranças, e apontavam para a demanda da população por um sistema político muito mais democrático do que o modelo representativo, partidário e eleitoral hoje vigente. As pessoas mostraram desilusão com esse modelo de sistema político, uma vez que ele tem sido secularmente marcado por corrupção e outras iniquidades éticas, governança em prol de interesses privados e sucateamento dos serviços públicos. Mas pelo que parece, o desejo de superar e mudar o sistema arrefeceu e devolveu o lugar a velhos vícios.
Em páginas facebookianas como a TV Revolta, o AnonymousBrasil e o MCC – Movimento Contra Corrupção, é visível, pelo enorme número de curtidores, a reincidência em tradicionais posturas limitadoras. Dentre elas, estão:
- a espera por um “salvador da pátria” ou a eleição apressada de um, sendo mais venerada a figura de Joaquim Barbosa;
- a designação de “vilões” a serem culpados e castigados por tudo o que há de ruim no país, como o PT, Lula e Dilma, que mereceriam ser derrotados pelos pretensos “salvadores”;
- a crença de que é possível eliminar problemas graves, como a corrupção e o descumprimento de promessas eleitorais, podando folhas e galhos pequenos ao invés de cortar tudo pela raiz;
- a defesa de soluções simples e rápidas para resolver problemas com séculos de tradição e raízes quilométricas, como “acabar com a corrupção” apenas tirando Dilma e sua equipe do governo federal – sem ao menos se saber quem colocar no lugar deles – mesmo que se mantenha todo o resto do cenário político do jeito que está;
- a recusa tácita de se estudar a fundo as tradições sociopolíticas do Brasil de modo a se saber quais são as causas da origem e perpetuação de problemas como as desigualdades sociais, a corrupção política, a desatenção governamental aos serviços públicos etc.;
- a insistência em usar o senso comum, ao invés de conhecimento a ser obtido em leituras devidamente fundamentadas e/ou observações empíricas adequadas, como fonte de “saber político”, o que leva ao intenso uso de falácias e preconceitos;
- a superficialidade na observação do contexto político, expressa quando se esquece que corrupção vai muito além de um único partido ou de alguns integrantes de um único governo, e se ignora que a má atenção para os serviços públicos não é culpa apenas do governo federal presidido por Lula e Dilma;
- a ignorância sobre o papel de prefeituras, câmaras de vereadores, governadorias e assembleias legislativas estaduais no estado público de coisas, culpando-se centralizadamente os governos federais aos quais o indivíduo se opõe;
- a rejeição de se problematizar o papel do capitalismo na perpetuação dos problemas da ordem sociopolítica vigente no Brasil;
- combinando tudo acima, o esquecimento de que as mudanças necessitadas pela população brasileira são radicais e sistemáticas e dispensam comportamentos como o ódio a um partido específico e a reivindicação da substituição de um governo como “grande solução”.
Com todos esses defeitos, os “indignados” estão caindo muito fácil na lábia de formadores de opinião mal intencionados. Estes aparecem posando de “líderes natos”, trazendo mensagens cativantes com as quais muita gente se identifica e, daí, ao terem conquistado a simpatia dessa população, doutrinam-nos, com mensagens bonitas “politizadas”, a uma opinião política rasa, reacionária e pautada na intolerância e no paliativismo. E isso ameaça estagnar o amadurecimento da consciência política de milhões de brasileiros e, ao invés de lhes atender o desejo de mudar a ordem política, perpetuá-la e favorecer interesses políticos escusos e nada democráticos.
Daí a posição mais sensata a se recomendar aos brasileiros é rejeitar as mensagens dos “Revoltas” e “MCCs” da vida e buscar de forma autônoma e horizontalizada conhecer primeiro as raízes de cada problema brasileiro de ordem sociopolítica, de modo que se possa saber como combater esses problemas, arrancá-los a partir da raiz. O brasileiro precisa parar de procurar líderes, heróis e salvadores e reconhecer a si mesmo como agente das fortes mudanças políticas de que a sociedade brasileira precisa para terminar e enterrar os flagelos que tanto lhe causam indignação e um crescente inconformismo.