sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Do luto à luta

Psicologia

RELACIONAMENTOS – Do luto à luta

by psicomarcosmarinho
publicado em recortes por
Do Site Obvious
Superar uma perda, significa muito mais do que ignorá-la ou passar a ocupar a mente com outras questões que implicam a vida. Transcender o luto, está mais relacionado a internalizar os aprendizados e encontrar sentido para o que se teve oportunidade de viver, pois jamais se pode tirar o que é incorporado à essência... À aquilo que, ao experimentado, passou a dar significado ao nosso ser.
Não há despertar da consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando ao limite do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Mas, ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim ao se conscientizar da escuridão.” (Carl Jung).
Desde o início da vida de uma criança, a negligência em questões relacionadas à perda (morte, derrota, mudança etc.), acontece de forma que, algo tão natural como a morte (devido à sua inevitabilidade), por exemplo, acaba se tornando um obstáculo quase sempre “mal superado”, podendo gerar deformações psíquicas no decorrer das idades.
O próprio fato de fazer algumas escolhas, muitas vezes acarreta em abrir mão de outras e, no caso, se em algum momento não lidei de maneira efetiva com minhas “perdas”, ou seja, se meus lutos não foram bem trabalhados e tratados, naturalmente que isso influenciará e muito no que se refere às escolhas em relação ao “o que” terei de abrir mão para seguir em frente.
Observei alguns casos de pessoas que permaneciam estagnadas em suas vidas quando tinham a oportunidade de serem melhores (em relação a elas próprias) e desenvolverem seus potencias, acreditando que aquelas eram suas escolhas quando, após algum tempo, se deram conta que na verdade, permaneciam ali por medo do desconhecido ou por apego à zona de conforto.
Por não se atentarem a essa condição natural da vida (desapego) é comum observarmos pessoas que não conseguem transcender em suas próprias vidas, permanecendo atrelados a trabalhos que não gostam; relacionamentos esgotados; estagnação em relação ao próprio potencial pessoal ou mesmo no que se refere à qualidade de vida.
É importante atentarmos à palavra DESENVOLVIMENTO: quando procuramos no dicionário, normalmente poderemos encontrar significados relacionados a “progresso”, “crescimento” etc.. Gosto de analisar essa palavra com um crivo mais psicanalítico quando parto para a perspectiva que, para poder me envolver de forma íntegra com o hoje, é necessário me “des” envolver com o ontem.
Observe que o desenvolvimento, nesse caso, tem a ver também com a maneira como nos desapegamos das coisas das pessoas e até mesmo das nossas memórias. Não significa que devemos ignorar ou esquecer, mas, mais profundo que isso, é internalizar o sentido ou significado da relação tornando-o parte de nós mesmos e não mais “separado” de nós.
Nos relacionamentos amorosos isso se elucida de forma clara quando pensamos que é necessário romper a relação com uma pessoa para iniciar uma com outra. Acredito que o que torna bonita a nossa passagem pela vida é essa realidade que pouco queremos aceitar, mas, quando nos damos conta efetivamente dela (perda), podemos passar a vivenciar as oportunidades com mais intensidade e, por conseguinte, vivermos de forma mais profunda e conectadas com os momentos que nos são concebidos.
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O ESTUDO DA MORTE
O homem possui uma extrema capacidade de adaptação, haja vista que a seleção natural refere-se a essa habilidade (presente em todas as diferentes formas de vida), como a tônica, no que diz respeito à sobrevivência de qualquer espécie. Assim sendo, lidar com a “perda da referência”, passa a ser um atributo da sobrevivência e continuidade.
Na TANATOLOGIA (parte da medicina legal que se ocupa da morte e dos problemas médico-legais com ela relacionados), esse processo (luto) não se restringe apenas à presença da morte. Ele também está presente em toda privação, nas rupturas matrimoniais, nos rompimentos com amigos e até mesmo a uma mudança de ambiente. Assim, este sentimento pode ser concebido, na verdade, como um mecanismo inerente à psique humana.
A resiliência (conceito psicológico emprestado da química, definido como a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas – choque, estresse etc. – sem entrar em surto psicológico.), é o estado chave para passar por esse processo (luto).
A American Psychological Association define resiliência como o “processo e resultado de se adaptar com sucesso a experiências de vida difíceis ou desafiadoras, especialmente através da flexibilidade mental, emocional e comportamental e ajustamento às demandas externas e internas”.
O estudo da TANATOLOGIA em psicologia diz que independente da perda, o indivíduo sempre passa pelas mesmas fases, que são cinco, as quais não necessariamente são sequenciais, podendo se revelar, ao mesmo tempo, dependendo de cada pessoa:
1. NEGAÇÃO: o indivíduo permanece anestesiado; há o surgimento da descrença. Nessa fase a pessoa nega a existência do problema ou situação. Pode não acreditar na informação que está recebendo, tentar esquecê-la, não pensar nela ou ainda buscar provas ou argumentos de que ela não é a realidade. Comportamentos comuns: Buscar uma segunda opinião ou outras explicações para a questão; Continuar se comportando como antes (ignorando a situação); Não aderir ao tratamento (no caso de doença) ou não falar sobre o assunto (no caso de morte, desemprego ou traição).
2. RAIVA: nessa fase a pessoa expressa raiva por aquilo que ocorre. É comum o aparecimento de emoções como revolta e ressentimento. Geralmente essas emoções são projetadas no ambiente externo; percebendo o mundo, os outros, Deus, etc. como causadores de seu sofrimento. A pessoa sente-se inconformada e vê a situação como uma injustiça. Comportamentos comuns: perde a calma quando fala sobre o assunto; recusa-se a ouvir conselhos; não quer falar sobre o assunto.
3. NEGOCIAÇÃO: nessa fase busca-se fazer algum tipo de acordo de maneira que as coisas possam voltar a ser como antes. Essa negociação geralmente acontece dentro do próprio indivíduo ou às vezes voltada para a religiosidade. Promessas, pactos e outros similares são muito comuns e muitas vezes ocorrem em segredo. Comportamentos comuns: rezar, fazer um acordo com Deus; buscar agradar (no caso de relacionamento); alimentar-se com produtos “lights” e diets para compensar os outros alimentos.
4. DEPRESSÃO: nessa fase ocorre um sofrimento profundo. Tristeza, desolamento, culpa, desesperança e medo são emoções bastante comuns. É um momento em que ocorre uma grande introspecção e necessidade de isolamento. Comportamentos comuns: chorar, afastar-se das pessoas; comportamentos autodestrutivos.
5. ACEITAÇÃO: Nessa fase percebe-se e vivencia-se uma aceitação do rumo das coisas. As emoções não estão mais tão à flor da pele e a pessoa se prontifica a enfrentar a situação com consciência das suas possibilidades e limitações. Comportamentos comuns: buscar ajuda para resolver a situação; conversar com outros sobre o assunto; planejar estratégias para lidar com a questão.
Esses estados variam em se tratando de tempo para cada pessoa e mediante a intensidade de cada situação. As pessoas não passam por essas fases de maneira linear, ou seja, elas podem superar uma fase, mas depois retornar a ela (ir e vir), estacionar em uma delas, sem ter avanços por longo período ou ainda suplantar todas as fases rapidamente até a aceitação. Não há regra. Tudo depende do histórico de experiências da pessoa e crenças que ela tem sobre si mesma e sobre a situação em questão.
A vida se resume a uma simples escolha: ocupar-se de viver ou ocupar-se de morrer” (William Shakespeare).
Partindo dessa premissa, podemos sim encurtar o percurso nessa “curva”, ao passo que, quando optamos por viver, naturalmente podemos acelerar o processo seguindo direto, da negação para a aceitação. Quando não nos damos conta desse procedimento natural, muitas vezes deixamos de viver o luto, negligenciando o processo ou fugindo dele.
Para elucidar, posso usar como exemplo o caso de um término abrupto de relacionamento mediante a traição: o individuo traído, pode escolher substituir a relação por outra e acreditar que superou o trauma anterior. O que ocorre é apenas a soma dos estados ao passo que, em qualquer outra situação de término, surgirá pensamentos como “tenho que ficar sozinho mesmo”, “ninguém presta” etc. ou mesmo a negação em se lançar para uma nova relação, usando a prudência como máscara para o medo oculto oriundo do trauma que não foi tratado.
Outra questão que pode surgir nascida dessa negligência é, levando em conta a capacidade humana de adaptação, em dado momento em que o indivíduo é revigorado pelo externo (atenção de outros, bajulação, cuidados excessivos etc.). Isso pode, necessariamente, se tornar um reforçador de comportamento corroborando para que se mantenha naquela condição e, sem que se dê conta, acaba perdendo a referência do seu próprio estado de equilíbrio, visto que o estado emocionalmente miserável que está vivendo, passa a ser a nova referência devido ao tempo e permanência mediante aos estímulos reforçadores as quais o sujeito é exposto.
É como aquela menina que põe uma foto de biquíni na internet e recebe atenção; outra que põe uma “frase de efeito” ou outra que se lamenta e é reforçada. Esse reforço, seja lá como se revelar, será, em grande parte, responsável pela permanência do indivíduo naquele estado junto aos comportamentos específicos.
Caberia ao indivíduo, trazer novamente as referencias positivas passadas para poder gerar uma equivalência entre os estados, acessar a sinestesia e, através da subjetividade, encontrar o estado emocional sumário já vivido, mas que, por questão de sobrevivência do organismo (cérebro primitivo), foi colocado em segundo plano (o organismo tende a se adaptar ao estado atual).
Caso aconteça com alguém próximo (o que normalmente acontece), é preciso estar atento aos reforçadores de comportamento, ajudando o sujeito a encontrar sentido e evitar reforçar o estado miserável, ao contrário, orientar o próprio a encontrar novas referências e caminhos assim como lançar-se a analise sobre os aprendizados oriundos daquela relação perdida.
A incorporação das experiências e aprendizados corrobora para o equilíbrio no momento em que o sujeito se dá conta que “o outro” não está necessariamente fora dele, mas sim, incorporado através das experiências adquiridas no processo em que se deu a relação.
A dor é suportável quando conseguimos acreditar que ela terá um fim e não quando fingimos que ela não existe.” (Allá Bozarth-Campbell).
psicomarcosmarinho | 20/02/2015 às 15:39 | Tags: luto, morte, psicoterapia | Categorias: ajuda psicológica, luto | URL: http://wp.me/p2NsmY-og
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Hercólubus ou Planeta Vermelho

 
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Seres extraterrestres de todos os rincões do Universo nos visitam há milênios. Em todas as partes do mundo estabelecem contatos com pessoas selecionadas e se preparam para nos ajudar ante as mudanças que ocorrerão na Terra. É totalmente imprescindível e urgente colocar luz sobre este tema.
A Associação Alcione envia pelo correio e de forma totalmente gratuita, exemplares impressos do livro "Hercólubus ou Planeta Vermelho", pequena obra onde seu autor, V.M.Rabolú, descreve a vida em outros planetas e explica a missão dos extraterrestres em um futuro próximo.
Grandes mudanças estão acontecendo agora em todo o mundo, os tiroteios Paris (Aproximação de Nibiru começa interferir no Emocional das pessoas no Mundo) o grande congelamento nos EUA esta semana. Tudo parece estar apontando para o céu para a resposta. 2015 Nibiru / Planeta X - 'no dia da chegada ...

A exaustão das água

Scientific American Brasil: A exaustão das água

Publicado . em Ecoleituras

10231Por Dal Marcondes - Está nas bancas a edição especial da revista Scientific American Brasil - A Exaustão das Águas, editada pelo competente Ulisses Capozzoli e com 13 artigos que procuram abordar uma multiplicidade de enfoque sobre o tema. Eu abordo a questão relacionada à água como direito humano e insumo econômico, o Julio Ottoboni trata dos impactos da destruição das florestas sobre o comportamento do clima. Também estão presentes José Galizia Tundisi, Ivanildo Hespanhol, Olive Heffernann, Rubens Junqueira Vilella, Ken Caldeira, Dan Baum, Rodrigo Lilla Manzione e David Biello. O resultado editorial ficou excelente e oferece novas perspectivas para a abordagem da crise hídrica brasileira.

crise da água ou nossa crise?

Cientistas brasileiros criticam descaso do governo com alertas sobre crise da água

Publicado . em Água
10228
Por Suzana Camargo
“A nossa situação é extremamente grave”. A afirmação é de Luiz Pinguelli Rosa, diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ). Ele foi um dos pesquisadores da Academia Brasileira de Ciências*, que se reuniram em (12/02), no Rio de Janeiro, para falar sobre a crise hídrica no país.
O tom do encontro foi de denúncia e crítica. “Em novembro de 2013 já era possível antever isso, sem nenhuma bola de cristal. Nós antevimos que esse problema ia acontecer, sugerimos racionalização do uso, sugerimos aumento tarifário, nada foi feito”, disse Paulo Canedo, chefe do Laboratório de Hidrologia da Coppe/UFRJ.
Em dezembro do ano passado, cientistas brasileiros divulgaram o documento Carta de São Paulo , quando fizeram novo alerta sobre o grave problema da falta de água no sudeste do Brasil.
“A governança do Brasil sempre foi ligada a uma abundância de água, e hoje vivemos uma escassez que não vai durar só um verão”, ressaltou José Galizia Tundisi, pesquisador do Instituto Internacional de Ecologia e especialista em recursos hídricos. “Num estado como São Paulo, o problema se agrava ainda mais, porque a economia depende de água – é o maior produtor do mundo de suco de laranja, de ovos, e sua população é do tamanho da Argentina.”
Para os cientistas, 2015 será um ano muito difícil. Eles são unânimes em dizer que, mesmo que chova acima da média histórica – algo que já se mostra praticamente impossível – o país sofrerá com falta de água e energia.
Outra crítica feita foi em relação a falta de transparência dos governos sobre a real gravidade da crise e a demora em tomar decisões importantes como, o incentivo à economia de água e luz. “Faltou transparência e continua faltando. A população não tem a real dimensão da crise e nem está sendo preparada para enfrentá-la. Isso, no mínimo é irresponsável”, afirmou Sandra Azevedo, diretora do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho.
Sandra chamou atenção sobre os efeitos que as interrupções no abastecimento de água podem ter sobre a saúde da população. “Qual o controle que temos, por exemplo, sobre a qualidade da água dos carros-pipa ou dos galões, que se tornaram populares? Temos os principais mananciais da região sudeste contaminados com componentes químicos muito tóxicos”, questionou.
Ainda segundo a pesquisadora, a diminuição na pressão da água aumentaria as chances de contaminação externa, já que as cidades brasileiras têm redes antigas com microfissuras nos canos. “Quando a água é aberta novamente, entra nas casas com contaminantes do solo, como esgoto e resíduos químicos”.
O cenário apontado pelos cientistas é que a região sudeste está muito longe de sair da crise. Pelo contrário, ela deve piorar ainda mais. Infelizmente, parece que pouca importância está sendo dada aos contínuos alertas da academia brasileira. “Não aprendemos nada com o ano de 2001, quando a escassez de água levou a “apagões” constantes”, comentou José Marengo, pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). “Esse fenômeno já aconteceu no passado, acontece agora e deve acontecer no futuro”.

Fonte: Planeta Sustentável.

#agua

A graça da não-notícia

Carlos Antonio Fragoso Guimarães está em um círculo assinado por você. Mais informações
Carlos Antonio Fragoso Guimarães
Compartilhada publicamente10:19
 
A imprensa em questão: Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, analisa o que os jornais dizem na tentiva de esconder
   Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para...
   Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder...
 
 

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

A imprensa em questão: Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, analisa o que os jornais dizem na tentiva de esconder

   Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para um lado ou para outro, usa o mito da objetividade para valorizar seus produtos e cobra de seus financiadores um custo por esse trabalho.
Luciano Martins Costa

LEITURA CRÍTICA

A graça da não-notícia

Por Luciano Martins Costa em 19/02/2015 na edição 838
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 19/2/2015
A leitura crítica dos jornais brasileiros pode produzir momentos interessantes, não propriamente pelo que dizem, mas principalmente pelo que tentam esconder. O hábito de analisar criticamente o conteúdo da mídia tradicional produz calos no cérebro, e eventualmente o observador passa a enxergar não mais a notícia, mas a não-notícia, ou seja, aquilo que o noticiário dissimula ou omite.
Trata-se de um exercício divertido, como se o leitor estivesse desfazendo um jogo de palavras cruzadas já preenchido. É mais ou menos como adivinhar, a partir das palavras que se interconectam num texto, o sentido que o autor pretendeu dar à sua construção. No entanto, embora o esquema seja interessante, a prática desse jogo de “interpretação reversa” não chega a ser instigante, porque a qualidade dos textos é geralmente muito pobre, e as intenções dos autores e editores se tornam muito explícitas. Mas não deixa de ser boa diversão, o que, afinal, ajuda a cumprir o novo papel da imprensa, o de entretenimento.
Há um bom número de exemplos nas edições dos jornais de quinta-feira (19/2), entre eles o esforço em manter a atenção do leitor com foco na lenta recuperação do reservatório da Cantareira, ao mesmo tempo em que apela ao bom senso para que as pessoas continuem a economizar a água.
No Jornal Nacional da TV Globo, a cada nota sobre o volume de chuvas em São Paulo segue-se a imagem da apresentadora, com expressão de madre superiora, lembrando que não basta a ajuda de São Pedro: é preciso seguir contando as gotas no chuveiro.
No Globo, chega a ser patético o esforço dos editores em celebrar a vitória da escola de samba Beija-Flor e ao mesmo tempo denunciar as relações de seu presidente, o bicheiro Anísio Abrahão David, com o ditador da Guiné Equatorial, que financiou o desfile carnavalesco.
Na Folha de S. Paulo, que produz três páginas especiais para festejar seus 94 anos, esse aspecto ambíguo da imprensa ganha ares oficiais: para mostrar que “o pluralismo é um dos pilares editoriais da Folha”, como diz o enunciado do material comemorativo, o jornal apresenta oito artigos sobre temas da atualidade. Assim, o leitor pode apreciar duas opiniões diferentes sobre as seguintes questões: “A presidente Dilma deve sofrer ação de impeachment em decorrência do escândalo da Petrobras?”; “O governador Alckmin é culpado pela crise hídrica em São Paulo?”; “Diante dos sinais de recessão, o BC deveria parar de subir os juros?”, e “As redes sociais tornam as pessoas mais egoístas?”
Por que a árvore caiu?
Decompondo a edição da Folha, pode-se afirmar que nenhuma das quatro questões admite apenas duas respostas, “sim” ou “não”, como propõe o jornal. Mas o mais interessante é que a Folha apresenta afirmações como se fossem perguntas. Por exemplo, se misturarmos as palavras, um dos enunciados seria: “O governador Alckmin deve sofrer ação de impeachment por ter adiado decisões sobre a crise hídrica por razões eleitorais?”; outro enunciado poderia ser: “A presidente Dilma é culpada pelo escândalo da Petrobras?”
Como se vê, a tal “pluralidade” já nasce condicionada, porque a imprensa brasileira quer convencer o leitor de que existem apenas duas interpretações possíveis para questões complexas como essas. E observe-se que todo o noticiário é composto por questões complexas, ou, no mínimo, controversas, porque é isso que define uma notícia.
Uma árvore caiu. Por que a árvore caiu? – mesmo num evento corriqueiro e aparentemente banal, há muitas respostas possíveis.
Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para um lado ou para outro, usa o mito da objetividade para valorizar seus produtos e cobra de seus financiadores um custo por esse trabalho.
Mas pode-se elaborar melhor essa análise. O observador arriscaria afirmar que a narrativa jornalística, tal como foi construída ao longo do tempo, já não dá conta de acompanhar a percepção da realidade, amplificada pelo domínio da imagem transmitida globalmente em tempo real. Como notou o filósofo Vilém Flusser, a superfície ínfima da tela substitui o mundo real. O que a imprensa faz é comentar essa superficialidade, não a realidade.
Mas a resposta é ainda mais simples: para ser levado a sério, um jornal precisa dar a impressão de concretude em seu conteúdo, mas, ao se tornar refém do mundo das imagens, produz uma concretude – ou, como diz Flusser, uma “concreticidade” superficial.
Essa superficialidade procura esconder o propósito do conteúdo jornalístico, que não é informar, com pensam os leitores correligionários: é induzir uma opinião específica.
Se tudo é opinião, tudo é não-notícia.

Escritor relata doença em artigo

Nova publicação em Psicologia

Oliver Sacks se despede após anunciar um câncer terminal

by psicomarcosmarinho

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Escritor relata doença em artigo no 'The NY Times': "Foi um privilégio e uma aventura"

"Acima de tudo, fui um ser com sentidos, um animal pensante, neste maravilhoso planeta, e isso, em si, foi um enorme privilégio e uma aventura" (Oliver Sachs)
Com um artigo simples, emotivo e direto, paradoxalmente cheio de otimismo, o escritor e neurologista Oliver Sacks anunciou na quarta-feira, no The New York Times, que sofre de um câncer terminal e que tem apenas mais algumas semanas de vida.
O autor, cujos livros sobre os subterfúgios da mente humana, como Tempo de Despertar e O Homem que Confundiu sua Mulher com um Chapéu, foram adaptados para o cinema e venderam milhões de exemplares no mundo inteiro.
Oliver Sacks, que tem 81 anos, recebeu a má notícia há algumas semanas, quando foi informando que sofre de metástase múltipla no fígado, procedente de um tumor original no olho detectado há oito anos. Ele afirmou que os médicos podem atrasar o avanço, mas não detê-lo.
Intitulada Minha Própria Vida, sua despedida é cheia de otimismo:
"Estou intensamente vivo e quero e espero que o tempo que me resta por viver me permita aprofundar minhas amizades, me despedir daqueles que amo, escrever mais, viajar se tiver a força suficiente, alcançar novos níveis de conhecimento e compreensão. Isso incluirá audácia, clareza e falar com franqueza; vou tratar de acertar minhas contas com o mundo. Mas também terei tempo para me divertir (inclusive para fazer alguma estupidez)".
O escritor confessa que não pensa em se dedicar a nada que não considere essencial, que não quer perder tempo. "Não posso dizer que não tenho medo. Mas meu sentimento predominante é a gratidão. Amei e fui amado; dei muito e me deram muitas coisas; li, viajei e escrevi".
A tranquila lucidez com a qual enfrenta a notícia de seu câncer sem volta é mais uma prova de sua sabedoria.
Fonte: El País
psicomarcosmarinho | 20/02/2015 às 12:31 | Tags: Oliver Sachs, psicologia | Categorias: psicologia | URL: http://wp.me/p2NsmY-oa
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quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

À luz da teoria Gestalt

Nova publicação em Psicologia

“O que fizemos (continuamos a fazer) das crianças que um dia fomos?”

by psicomarcosmarinho

À luz da teoria Gestalt, o psicólogo Walter Ribeiro lança livro acerca do desenvolvimento infantil e interações com o outro.

capaEspecializado em Gestalt Terapia, o psicólogo Walter Ribeiro lançará, em Brasília, livro que aborda a deterioração da infância a partir das interações com o social. O evento de lançamento do título “O que fizemos (continuamos a fazer) das crianças que um dia fomos?” acontecerá no próximo dia 13 de março, a partir das 18:30, na Livraria Sebinho, em Brasília.
À luz da teoria Gestalt, o autor realiza uma observação do processo de desvio do natural desenvolvimento infantil a partir da imposição de regras e costumes pré-estabelecidos. De acordo com o livro, a partir dos três anos a criança é “forçada a abandonar a pureza de sua forma em se relacionar com os outros e incluir no seu comportamento as normas e valores de sua tribo”.
O psicólogo Walter Ribeiro é um dos pioneiros da Gestalt Terapia no Brasil, responsável por trazer a abordagem para Brasília. “A gestalt é, em si, uma filosofia. Ela vai buscar força em si mesma”, disse Ribeiro, em entrevista ao jornal Correio Braziliense, em 2010.  Na ocasião, ele destacou que a diferença da terapia Gestalt é que o outro não é tratado como um inferior, como um doente, mas como igual. Segundo ele, foi implantado pela civilização, há séculos, um sistema hierárquico de convivência. “Nós achamos que esse sistema é responsável pela maior parte dos distúrbios e desajustes da pessoa”, disse.
Walter Ribeiro foi fundador do CEGEST – Centro de Estudos de Gestalt Terapia de Brasília - em 1984. É membro do Conselho Diretor do CEGEST e docente dos cursos de especialização.
O livro é publicado pela Editora Thesaurus.
Serviço:
Lançamento do livro “O que fizemos (continuamos a fazer) das crianças que um dia fomos?”
Autor: Walter Ribeiro
Data/hora: 13 de março, a partir das 18:30
Local: Livraria Sebinho – Cln 406, Bloco C, s/n, Lojas 30/34/44/72 – Asa Norte, Brasília – DF
psicomarcosmarinho | 19/02/2015 às 16:55 | Tags: gestalt, psicologia | Categorias: psicologia | URL: http://wp.me/p2NsmY-o8

os ataques à Petrobrás

Carlos Antonio Fragoso Guimarães
Compartilhada publicamente13:13
 
Luis Fernando Veríssimo e Diogo Santos refletem os ataques à Petrobrás sob a ótica do contexto maior: a velha guerra pelo seu controle e seu petróleo
"Do ponto de vista da eternidade nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no contexto maior da vel...
 

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Luis Fernando Veríssimo e Diogo Santos refletem sobre os ataques à Petrobrás sob a ótica do contexto maior: a velha guerra pelo seu controle e seu petróleo

"Do ponto de vista da eternidade nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no contexto maior da velha guerra pelo seu controle, que já dura quase 70 anos, desde que a Petrobras venceu a primeira batalha, a que lhe permitiu simplesmente existir, quando diziam que nunca se encontraria petróleo no Brasil."

Luis Fernando Veríssimo

  "A campanha contra a Petrobras levada à frente pelo bloco conservador brasileiro é, neste contexto, absolutamente funcional aos interesses das petroleiras ocidentais estrangeiras. Mais do que enfraquecer a Petrobras, esta campanha objetiva retirar do Brasil o controle sobre seu próprio futuro, como várias vezes vimos acontecer na história da estatal e na história do país".
Diogo Santos
Seguem dois textos sobre os interesses por trás do massacre midiático contra a Petrobrás:

O Contexto Maior

Luis Fernando Veríssimo
  Recomenda-se a desiludidos com a atualidade em geral e com o PT em particular a procurar refugio no contexto maior. O contexto maior não absolve, exatamente, o contexto imediato, a triste realidade de revelações e escândalos de todos os dias, mas consola. Nossa inspiração deve ser o historiador francês Fernand Braudel, que — principalmente no seu monumental estudo sobre as civilizações do Mediterrâneo — ensinou que, para se entender a Historia, é preciso concentrar-se no que ele chamava de la longue durée, que é outro nome para o contexto maior. Braudel partia do particular e do individual para o social e daí para o nacional e o generacional, se é que existe a palavra, e na sua história da região, o indivíduo e seu cotidiano eram reduzidos a “poeira” (palavra dele também, que incluía até papas e reis) em contraste com a longue durée, o longo prazo da história verdadeira. Assim na sua obra se encontram as minúcias da vida diária nos países do Mediterrâneo mas compreendidas sub specie aeternitatis, do ponto de vista da eternidade, que é o contexto maior pedante.
  Do ponto de vista da eternidade nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no contexto maior da velha guerra pelo seu controle, que já dura quase 70 anos, desde que a Petrobras venceu a primeira batalha, a que lhe permitiu simplesmente existir, quando diziam que nunca se encontraria petróleo no Brasil. Mais do que em qualquer outra frente de confronto entre conservadores e progressistas e direita e esquerda no Brasil, na luta pela Petrobras, e por tudo que ela simboliza além da exploração de uma riqueza nacional, se definem os lados com nitidez. A punição dos responsáveis pelos desvios que enfraqueceram a estatal deve ser exemplar e todos os partidos beneficiados que se expliquem como puderem, mas que se pense sempre no contexto maior, no qual a sobrevivência da estatal como estatal, purgada pelo escândalo, é vital.
  Fernand Braudel viveu e lecionou no Brasil. Não conheço nenhum texto dele sobre sua experiência brasileira. Seria interessante saber como ele descreveria, ou preveria, hoje, a longue durée da nossa História. O que significaria, na sua avaliação, o longo dia no poder do PT? O contexto maior tudo perdoaria ou tudo justificaria? Enfim, o contexto maior de todos é o Universo, que, no fim, engole todos os significados. O que também não é um consolo...

Importância do Pré-Sal (e da Petrobrás) na Geopolítica do Petróleo

Diogo Santos


  O Brasil vive um período de repactuação entre o capital público e as frações capital privado em relação aos seus diferentes papéis no próximo ciclo de crescimento da economia brasileira. Garantir a indispensável participação do capital público é tarefa que deve unificar todos os setores avançados da nação. A unidade se torna imprescindível quando do outro lado estão interesses sensíveis do Imperialismo, como é o caso do petróleo na camada pré-sal.
  Ignácio Rangel, ilustre pensador brasileiro e certamente o mais original entre nossos grandes economistas, escreveu que o setor público e o setor privado devem repactuar suas respectivas participações na economia sempre que as oportunidades de investimentos de um ciclo econômico estão se esgotando. Nas superiores palavras de Rangel:
“Quer isso dizer que a lua-de-mel entre o setor privado e o setor público da economia dura enquanto, por um lado, o empresariado capitalista considera suficientes as oportunidades de investimentos que lhe são abertas e enquanto as responsabilidades deixadas ao Estado não exigem dele que tente aumentar demasiado sua participação no dividendo nacional. Periodicamente, esse equilíbrio se rompe, tornando necessária uma redistribuição de funções, e essa ruptura de equilíbrio se manifesta por uma série de perturbações – notadamente, ao longo do processo de industrialização, o recrudescimento do processo inflacionário, o qual supõe […] precisamente o esgotamento das oportunidades de investimento para o empresariado capitalista.”

  No Brasil, vivemos este período nos anos recentes. A campanha eleitoral catalisou a disputa em torno da decisão de quem dará as cartas na próxima rodada de crescimento econômico. Após o segundo turno, a definição da equipe econômica do próximo governo Dilma foi o capítulo mais aguardado, pois sua composição sinalizaria qual pacto o governo pretende fazer com as frações financeira e produtiva do capital.
  A realização dos contratos de investimentos no setor de logística foi um momento importante desta repactuação entre o capital público e o privado. A adoção do modelo de concessão reforça a presença de um Estado menos subserviente às imposições do capital privado. Do outro lado da corda, as empresas pressionaram para aumentar o retorno mínimo dos contratos. O tempo gasto além do esperado para destravá-los releva certamente as inescapáveis rodadas de pressão de ambos os lados.
  O capítulo mais importante, entretanto, da definição de papéis entre o público e o privado se deu em torno do modelo de exploração do pré-sal. O regime de partilha é uma grande conquista para uma nação cuja soberania ainda está em construção. Não por acaso, ainda hoje encontramos os porta-vozes locais de interesses estrangeiros defendendo o retorno ao modelo anterior, no fundo, por discordarem do pacto proposto pelo Estado brasileiro.
  Poucos temas estão tão imbricados com os interesses das potências hegemônicas do capitalismo como o controle sobre a produção mundial do petróleo. A relevância do pré-sal para as petroleiras tradicionais deriva de sua magnitude, mas é reforçado pelos movimentos realizados no setor de energia, desde o início dos anos 2000, por dois grandes países em desenvolvimento: Rússia e China.
  A Rússia viveu durante a década de 1990 a formação de uma plutocracia durante governo antinacional de Yeltin, patrocinada pelo Estado, que levou a graves prejuízos para a indústria do petróleo russa. O conluio entre governo e banqueiros fatiou e distribuiu as recém-criadas empresas para privatização. Um dos mecanismos utilizados foram os empréstimos tomados pelo governo que tinham como garantias as ações das empresas ainda não privatizadas. Caso o governo não pagasse o empréstimo o banco colocava as ações em leilão. O governo não pagava, os leilões eram de fachada e os bancos se tornavam proprietários das ações. A empresa Yukos, por exemplo, foi adquirida por US$390 milhões, avaliada em seguida com o valor de US$15 bilhões. Uma das consequências deste verdadeiro saque ao patrimônio do povo russo foi que em 1996, a produção de petróleo foi de apenas 60% do valor recorde do ano de 1987.
  A partir do primeiro governo Putin, a Rússia percorreu um caminho de retomada do controle público sobre o estratégico setor de petróleo e gás como parte da retomada de um projeto de desenvolvimento nacional. O governo alterou o regime de tributação e conseguiu aumentar as receitas oriundas do setor; o BC russo adotou mecanismos para que grande parte das receitas das empresas permanecesse na Rússia; e a estatal do petróleo, a Rosneft, e a estatal do gás, a Gazprom, passaram adquirir participação acionária e ativos das empresas vistas como estratégicas ou desconectadas dos interesses nacionais. Em poucos anos, a produção de petróleo voltou a crescer vigorosamente.
  O controle soberano da Rússia sobre a economia do petróleo e gás retira a capacidade das tradicionais petroleiras ocidentais, ancoradas nos respectivos Estados, de dominarem uma das maiores reservas do mundo. As reservas de outros países, consequentemente, se tornam ainda mais relevantes. Ao mesmo tempo, a determinada política russa de ampliação da produção e exportação de petróleo amplia a concorrência pelos mercados consumidores.
  A Rússia, todavia, ainda não se libertou da enorme dependência que sua economia possui do setor do petróleo, o que a torna vulnerável às pressões externas. E aqui é preciso fazer alguns comentários sobre a atual crise no preço do petróleo e seus impactos sobre a Rússia, mesmo que temporariamente nos afastemos do intento principal deste texto.
  De junho até dezembro deste ano o preço do barril do petróleo caiu 45%, chegando a estar abaixo dos US$60,00, menor valor desde 2009. A persistente crise economia mundial ainda vivida em todas as partes do mundo e a extração do petróleo de xisto dos EUA contribuíram para a oferta de petróleo exceder a demanda e assim derrubar o preço. Entretanto, a decisão da Opep, que comercializa cerca de 40% do petróleo vendido no mundo, de manter o volume de produção em um nível sabidamente muito acima da capacidade de consumo mundial foi o fator mais desestabilizador do preço da commodity.
  Ao que parece, esta postura da Opep – da Arábia Saudita em especial, pois outros membros como a Venezuela propuseram a redução da oferta para evitar o derretimento do preço – é uma tática de concorrência por meio de preço predatório. A Arábia Saudita é responsável por mais de 30% do total produzido pela Opep e possui o menor custo de produção de petróleo do mundo, o que lhe dá um grande poder de suportar preços baixos. Com o preço do barril acima de US$70,00, muitos projetos de exploração de alto custo passariam a ser viáveis, o que ampliaria a concorrência. O banco Goldman Sachs avalia que muitos campos que estão na iminência de serem explorados se tornam inviáveis com os níveis atuais do preço do petróleo. As consequências serão atrasos de investimentos, necessidade de redução de custos, vendas de ativos e desvalorização das empresas que operam em campos que possuem custos elevados. A disposição da Opep de não intervir na queda do preço e deixar entender que permitirá uma queda ainda maior, manifesta esta tática de concorrência predatória.
  A Rússia que até então vinha enfrentando razoavelmente o impacto das sanções econômicas impostas pelos EUA e UE, tomou um grande golpe com a queda do preço do petróleo nos últimos meses. A fuga de capitais decorrente das sanções se intensificaram com a queda do preço. Em novembro o BC, que já vinha aumentando a taxa básica de juros, passou adotar o regime de câmbio flutuante. Somente no dia 15 de dezembro, a moeda russa perdeu 10% de valor frente ao dólar. No dia 16, o BC decidiu elevar a taxa de juros de 10,5% para 17%, em uma forte medida de tentar estancar o processo de desvalorização do rublo.
  A desvalorização da moeda na intensidade que ocorreu pressionará para cima a taxa de inflação, diminuirá em grande medida a arrecadação do Estado com as receitas do setor do petróleo provocando um inevitável corte de gastos, desvalorizará as empresas com grande volume de dívidas denominadas em dólar, o que poderá levar a mais fuga de capitais e mais pressão sobre a taxa de câmbio. O aumento da taxa de juros, por sua vez, reforça um horizonte de recessão no próximo ano. No momento em que a Rússia enfrenta seu maior embate geopolítico em anos, o governo russo terá que lidar com repercussões negativas da grande desvalorização do rublo. Impossível não pensar na provável articulação entre Arábia Saudita e as potências ocidentais para derrubar o preço do petróleo e estrangular a Rússia.
 Voltando ao curso principal do texto, falemos do segundo país que também tem desempenhado um importante papel na última década com repercussões sobre a geopolítica do petróleo.
  A China vem adotando uma política decidida de construir sua segurança energética e ter a garantia de que seu processo de desenvolvimento não será bloqueado por escassez de petróleo. O país asiático já é o maior consumidor de energia do mundo, respondendo por 19% da demanda mundial e estudos tem apontado que se tornará o maior importador de petróleo nos próximos anos. Atualmente a China importa 59% de sua demanda de petróleo e derivados.
  Ciente de que não pode se tornar dependente dos países produtores de petróleo do Oriente Médio, devido à instabilidade interna destes países e sintonia com a política norte-americana, a China realiza grandes investimentos em várias partes do mundo. Turcomenistão, Cazaquistão, Uzbequistão, Egito, Equador, Venezuela, Canadá, Quênia e Uganda são países que possuem participação chinesa na exploração de petróleo de alguma maneira, seja via estatais chinesas, join ventures ou participações em empresas locais ou estrangeiras.
  Entre todos estes investimentos, destacam-se os feitos na África. A China tem feito investimentos em diversos setores naquele continente como em infraestrutura logística, construção de hospitais e escolas. Tem firmado parcerias de intercâmbio entre universidades chinesas e africanas, fornecido equipamentos militares e realizado perdão de dívidas de governos. Desde 2009, a China é o principal parceiro comercial da África.
  Esta forte e crescente presença da China na África já despertou o receio das grandes potências ocidentais que acusam a China de pretender colonizar a África. Na realidade, a China tem disponibilizado os recursos aos países africanos que sempre foram negados pelas instituições controladas pelos EUA como o Banco Mundial e o FMI. Ademais, a China não impõe aos países africanos as exigências que acompanham os pacotes de empréstimos destes órgãos. Sem desconsiderar as precauções que os países africanos devem tomar para aproveitar a presença chinesa para seu desenvolvimento, a desfaçatez desta crítica feita pelo ocidente à China através da Imprensa alinhada, Secretários de Relações Exteriores dos diversos países e representantes na África, desnuda a situação de uma civilização que tem ficado com cada vez menos alternativas para enfrentar o potente modelo econômico construído na China desde a Revolução liderada pelo Partido Comunista. Todas estas décadas de benevolência do Ocidente com a África, só lhe rendeu mazelas sociais e fotografias de alguma estrela de Hollywood com suas crianças.
  No setor do petróleo, a presença chinesa na África é solidamente crescente. O Sudão é atualmente o terceiro maior produtor de petróleo da África devido ao volume de investimentos feitos pela China através das estatais CNPC e Sinopec. O país produzia em 2000, 174 mil barris de petróleo por dia e passou a produzir em 2010, 486 mil. A China é a maior fonte de investimento direto externo do país. Na Nigéria e Angola, o primeiro e o segundo maiores produtores de petróleo da África respectivamente, a hegemonia das petroleiras Shell, ExxonMobil, Chevron Texaco, Total e BP foi quebrada pela gigante chinesa, CNOOC. Para se ter dimensão da presença da China na Angola, basta dizer que este país disputa com a Arábia Saudita a posição de principal origem das importações chinesas de petróleo. A CNOOC também atua na Guiné Equatorial que saltou sua produção de 91 mil para 274 mil b/d entre 2000 e 201o.
  O poder das estatais do petróleo chinesas é reforçado por estarem inseridas na estratégia nacional de desenvolvimento de seu país. Por um lado, podem ter um comportamento mais ousado, uma vez que não necessitam ser lucrativas isoladamente, o que lhes dá grande vantagem sobre as concorrentes privadas. Por outro lado, o governo chinês quando necessário reforça as ofertas feitas pelas empresas nas licitações de licenças de exploração petróleo por meio da disponibilização de empréstimos nos bancos de desenvolvimento chineses aos países possuidores das reservas petrolíferas.
  No Brasil a presença chinesa não se restringe na participação da CNPC e da CNOOC no consórcio que venceu o leilão do campo de libra. Em 2005, a Sinopec participou da construção de um gasoduto entre o sudeste e nordeste brasileiros. Em 2009, assinou um importante contrato com a Petrobras, possibilitando que esta obtivesse um empréstimo de US$10 bilhões no Banco de desenvolvimento da China. Em 2010, após a descoberta do pré-sal, a Sinopec e a Sinochem passaram a adquirir ativos de outras empresas estrangeiras que atuam no Brasil.
  O cenário da ação chinesa no setor de petróleo traz a inescapável consequência de ampliar a concorrência e impor novos condicionantes à política adotada pelas petroleiras ocidentais tradicionais, além de restringir a participação destas empresas no maior mercado consumidor de petróleo do próximo período. Para as petroleiras ocidentais é imperativo que disputem com a China o direito de exploração das novas áreas. No pré-sal, os chineses saíram na frente.
  O contexto de maior competição mundial na indústria do petróleo faz do pré-sal uma reserva muito valiosa. O acirramento da concorrência intercapitalista impõe aos capitais individuais a necessidade de intensificarem a acumulação, o que torna as áreas abertas para valorização do capital cada vez mais disputadas.
 A campanha contra a Petrobras levada à frente pelo bloco conservador brasileiro é, neste contexto, absolutamente funcional aos interesses das petroleiras ocidentais estrangeiras. Mais do que enfraquecer a Petrobras, esta campanha objetiva retirar do Brasil o controle sobre seu próprio futuro, como várias vezes vimos acontecer na história da estatal e na história do país.
 Uma página a parte da ofensiva conservadora é a ação contra a Petrobras em curso na justiça dos EUA, que pode custar centenas de milhões de dólares à estatal brasileira, movida por um escritório de advocacia especializado na rapinagem.
 Esses escritórios se aproveitam de momentos de dificuldades das empresas, buscam alguma regra do mercado de capitais norte-americano que elas possam ter infringido, convocam os acionistas para abrirem o processo judicial e lucram milhões de dólares com a causa.
 O editorial do jornal O Globo que defende abertamente a revisão do modelo de partilha e a entrada das petroleiras ocidentais na exploração do pré-sal não fez mais do que explicitar a razão da campanha orquestrada contra a Petrobras: dilapidar a autoridade do PT, de Dilma e de Lula e desvalorizar a Petrobras a fim de inviabilizar a participação diferenciada da estatal na exploração do pré-sal.
 É da soberania brasileira que se trata o tema da exploração do pré-sal, portanto interessa a toda a nação. Diante do panorama de exacerbação da concorrência no mercado mundial de petróleo, a tentativa de enfraquecer a Petrobras e, portanto, a participação do capital público no pré-sal exige um grau de unidade dos setores nacionalistas e democráticos em um patamar elevado. Algumas iniciativas têm contribuído para gestar um programa político que lance as bases para esta unidade necessária. As frentes de defesa da Reforma Política Democrática como a Coalizão Democrática, o Encontro do Fórum Nacional de Democratização da Mídia marcado para os primeiros meses de 2015, a criação do Fórum21 e as plenárias conjuntas de partidos de esquerda, organizações sociais e centrais sindicais são exemplos destas iniciativas.
 O próximo ano vai se desenhando para os setores avançados da sociedade brasileira como o momento de exercitar e transformar em ação política mobilizadora as iniciativas citadas anteriormente. A defesa da exploração soberana do pré-sal será um bom teste.
 Diogo Santos é graduado em Economia pela UFMG, membro da Sessão Mineira da Fundação Maurício Grabois
Fonte: Carta Maior