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Carlos Antonio Fragoso Guimarães
Compartilhada publicamente10:19
A imprensa em questão: Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, analisa o que os jornais dizem na tentiva de esconder
Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para...
Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para...
Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem
considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a
imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce
esse poder...
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015
A imprensa em questão: Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, analisa o que os jornais dizem na tentiva de esconder
Por que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce esse poder fazendo pender as opiniões para um lado ou para outro, usa o mito da objetividade para valorizar seus produtos e cobra de seus financiadores um custo por esse trabalho.
Luciano Martins Costa
LEITURA CRÍTICA
A graça da não-notícia
Por Luciano Martins Costa em 19/02/2015 na edição 838
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 19/2/2015
A leitura crítica dos jornais brasileiros pode produzir momentos
interessantes, não propriamente pelo que dizem, mas principalmente pelo
que tentam esconder. O hábito de analisar criticamente o conteúdo da
mídia tradicional produz calos no cérebro, e eventualmente o observador
passa a enxergar não mais a notícia, mas a não-notícia, ou seja, aquilo
que o noticiário dissimula ou omite.
Trata-se de um exercício divertido, como se o leitor estivesse
desfazendo um jogo de palavras cruzadas já preenchido. É mais ou menos
como adivinhar, a partir das palavras que se interconectam num texto, o
sentido que o autor pretendeu dar à sua construção. No entanto, embora o
esquema seja interessante, a prática desse jogo de “interpretação
reversa” não chega a ser instigante, porque a qualidade dos textos é
geralmente muito pobre, e as intenções dos autores e editores se tornam
muito explícitas. Mas não deixa de ser boa diversão, o que, afinal,
ajuda a cumprir o novo papel da imprensa, o de entretenimento.
Há um bom número de exemplos nas edições dos jornais de quinta-feira
(19/2), entre eles o esforço em manter a atenção do leitor com foco na
lenta recuperação do reservatório da Cantareira, ao mesmo tempo em que
apela ao bom senso para que as pessoas continuem a economizar a água.
No Jornal Nacional da TV
Globo, a cada nota sobre o volume de chuvas em São Paulo segue-se a
imagem da apresentadora, com expressão de madre superiora, lembrando que
não basta a ajuda de São Pedro: é preciso seguir contando as gotas no
chuveiro.
No Globo, chega a ser patético
o esforço dos editores em celebrar a vitória da escola de samba
Beija-Flor e ao mesmo tempo denunciar as relações de seu presidente, o
bicheiro Anísio Abrahão David, com o ditador da Guiné Equatorial, que
financiou o desfile carnavalesco.
Na Folha de S. Paulo, que
produz três páginas especiais para festejar seus 94 anos, esse aspecto
ambíguo da imprensa ganha ares oficiais: para mostrar que “o pluralismo é
um dos pilares editoriais da Folha”,
como diz o enunciado do material comemorativo, o jornal apresenta oito
artigos sobre temas da atualidade. Assim, o leitor pode apreciar duas
opiniões diferentes sobre as seguintes questões: “A presidente Dilma deve sofrer ação de impeachment em decorrência do escândalo da Petrobras?”; “O governador Alckmin é culpado pela crise hídrica em São Paulo?”; “Diante dos sinais de recessão, o BC deveria parar de subir os juros?”, e “As redes sociais tornam as pessoas mais egoístas?”
Por que a árvore caiu?
Decompondo a edição da Folha,
pode-se afirmar que nenhuma das quatro questões admite apenas duas
respostas, “sim” ou “não”, como propõe o jornal. Mas o mais interessante
é que a Folha apresenta
afirmações como se fossem perguntas. Por exemplo, se misturarmos as
palavras, um dos enunciados seria: “O governador Alckmin deve sofrer
ação de impeachment por ter adiado decisões sobre a crise hídrica por
razões eleitorais?”; outro enunciado poderia ser: “A presidente Dilma é
culpada pelo escândalo da Petrobras?”
Como se vê, a tal “pluralidade” já nasce condicionada, porque a imprensa
brasileira quer convencer o leitor de que existem apenas duas
interpretações possíveis para questões complexas como essas. E
observe-se que todo o noticiário é composto por questões complexas, ou,
no mínimo, controversas, porque é isso que define uma notícia.
Uma árvore caiu. Por que a árvore caiu? – mesmo num evento corriqueiro e aparentemente banal, há muitas respostas possíveis.
Por
que a imprensa brasileira tenta pintar tudo em preto e branco, sem
considerar as muitas tonalidades entre os dois extremos? Ora, porque a
imprensa faz parte do sistema de poder na sociedade moderna, e exerce
esse poder fazendo pender as opiniões para um lado ou para outro, usa o
mito da objetividade para valorizar seus produtos e cobra de seus
financiadores um custo por esse trabalho.Mas pode-se elaborar melhor essa análise. O observador arriscaria afirmar que a narrativa jornalística, tal como foi construída ao longo do tempo, já não dá conta de acompanhar a percepção da realidade, amplificada pelo domínio da imagem transmitida globalmente em tempo real. Como notou o filósofo Vilém Flusser, a superfície ínfima da tela substitui o mundo real. O que a imprensa faz é comentar essa superficialidade, não a realidade.
Mas a resposta é ainda mais simples: para ser levado a sério, um jornal
precisa dar a impressão de concretude em seu conteúdo, mas, ao se tornar
refém do mundo das imagens, produz uma concretude – ou, como diz
Flusser, uma “concreticidade” superficial.
Essa superficialidade procura esconder o propósito do conteúdo
jornalístico, que não é informar, com pensam os leitores
correligionários: é induzir uma opinião específica.
Se tudo é opinião, tudo é não-notícia.