Trensalão: Justiça e MP paulistas inventaram a corrupção sem corrupto
Posted by eduguim on 21/03/15 • Categorized as Opinião do blog
O
Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou denúncia do Ministério Público
e iniciou ação contra 11 empresas acusadas de promover cartel para
obtenção de contratos com a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
(CPTM). A estatal também se tornou ré. Esse processo específico diz
respeito ao período entre 2002 e 2007, mas as denúncias abrangem os
governos Mário Covas e José Serra e envolvem, também, o metrô paulista.
O sistema de trens
urbanos e suburbanos de São Paulo é considerado um dos mais ineficientes
e superlotados do mundo. Ano retrasado, a BBC Brasil divulgou
uma reportagem que mostra que, no ritmo atual de expansão do metrô
paulistano, levaria 172 anos para a cidade ter um sistema como o de
Londres, por exemplo.
O cálculo foi feito pela
BBC Brasil com base nos dados de extensão atual dos sistemas e dos anos
de existência de cada um. O sistema da capital paulista, inaugurado em
1974, tem hoje 74,3 quilômetros de extensão – numa média de expansão de
1,91 quilômetro por ano. O metrô de Londres, em operação desde janeiro
de 1863, tem 405 quilômetros e uma expansão média de 2,68 quilômetros
por ano.
Parece até que o ritmo
de expansão do metrô londrino e o do metrô paulistano não estão muito
distantes, mas deve-se levar em conta que a velocidade de construção de
novas linhas na capital inglesa permanece mais alta que a nossa apesar
de aquela cidade já estar servida de uma rede de trens urbanos e
suburbanos mais do que suficiente. Apesar disso, o metrô, por lá,
continua crescendo rapidamente.
A razão pela qual a rede
do metrô paulistano e de trens suburbanos da CPTM não avançam reside na
ação que o TJ-SP iniciou: corrupção.
Para simplificar,
empreiteiras e fabricantes de trens contratados para expandir o metrô e a
CPTM venceram concorrências no âmbito de uma imensa fraude. Como havia
várias empresas concorrentes, elas se reuniam e faziam um acordo para
roubar o erário paulista.
As empresas que a
Justiça paulista está processando combinavam os preços que ofereceriam
nas concorrências abertas pelos governos do PSDB paulista nos últimos 20
anos. Os preços eram mais elevados do que o normal justamente para que
os vencedores pudessem dividir o lucro com os vencidos.
Algumas empresas
entravam na concorrência para vencer e outras, para perder. Terminado o
certame, os vencedores subcontratavam os vencidos e todos executavam as
obras, dividindo os preços superfaturados que o governo do Estado
aceitava.
Esse esquema vinha
funcionando desde o governo Mario Covas, o primeiro do PSDB em São
Paulo, e se estendeu até o governo José Serra (2006-2010).
De 1998 a 2010, nem
Mario Covas, nem Geraldo Alckmin, nem José Serra desconfiaram de nada,
apesar de o erário paulista estar pagando tanto mais caro pelas obras do
metrô e da CPTM que o dinheiro era suficiente para contemplar TODAS as
empreiteiras e os fabricantes de trens envolvidos nas obras de expansão
ferroviária.
Durante muito tempo, a
roubalheira ocorria sem que o Ministério Público de São Paulo e a
Justiça tomassem qualquer providência. Isso apesar de as empresas
fraudadoras que atuavam em São Paulo estarem sendo investigadas na
Europa, em países como a Suíça, que avisaram as autoridades paulistas e
foram ignorados.
Em 2013, o então
corregedor nacional do Ministério Público, Alessandro Tramujas, decidiu
instaurar reclamação disciplinar contra o procurador da República de São
Paulo Rodrigo De Grandis. O motivo, as suspeitas de que teria
trabalhado para atrasar o andamento das investigações do ministério
público da Suíça contra a empresa francesa Alstom no Brasil.
A instauração do
procedimento administrativo vio depois de o MP suíço ter anunciado o
trancamento de parte das apurações das atividades da Alstom em São Paulo
por falta de cooperação das autoridades locais.
O procurador De Grandis
se defendeu dizendo que houve “falha administrativa”; o pedido de
diligências suplementares teria sido “arquivado erroneamente em uma
pasta de documentos auxiliares, quando deveria ser juntado ao processo
de cooperação internacional”. Sob os cuidados de De Grandis, os
documentos ficaram perdidos nas gavetas do MP paulista.
É inútil dizer que as
apurações contra De Grandis deram em nada. Acreditaram mesmo que ele
“esqueceu” em uma gaveta o processo enviado pela Suíça.
É possível que um grupo
de empresas gigantes do setor de construção civil e de trens roube
durante quase vinte anos os cofres públicos paulistas – e roube tanto
que dê para dividir com todas as empresas que disputaram as
concorrências – sem que nenhuma autoridade política do governo do Estado
fique sabendo ou seja conivente?
É isso, em síntese, o
que dizem o Ministério Público e o Tribunal de Justiça de São Paulo.
Dezenas de bilhões de dólares escorreram pelo ralo da corrupção no
Estado mais rico e desenvolvido da Federação e, apesar do alerta das
autoridades de países europeus como Suíça e França, os governadores
desse Estado nunca souberam de nada.
Um esquema de
roubalheira de recursos públicos que funcionou por quase duas décadas
tornou infernal a vida dos habitantes da Grande São Paulo. Trens
superlotados, linhas insuficientes, ridiculamente pequenas ante as de
outros países, preços caros das passagens e nenhum político estava
envolvido (?!).
O pior é o deboche. Os
que governam SP se dizem “vítimas” dessa imensa rede de corrupção que
germinou debaixo dos seus narizes sem que nunca tenha havido
investigação por iniciativa das autoridades paulistas – a investigação
ocorreu por pressão estrangeira e pela autodenúncia da multinacional
Siemens.
A abertura dessa ação
pelo Tribunal de Justiça de São Paulo é um deboche. Em resumo, diz que
no grande esquema de corrupção montado pelas empresas indiciadas só
havia corruptores e nenhum corrupto, pois só os que promoveram as
fraudes que extorquiram o povo paulista estão sendo processados.
Nenhuma autoridade
paulista do primeiro escalão foi responsabilizada. O governo de São
Paulo pagando o dobro, o triplo do que custavam bens e serviços
fornecidos pelas empresas fraudadoras e o governo só pagando, pagando,
pagando sem desconfiar de absolutamente nada. O dinheiro faltando para
Saúde, Educação, Segurança, Transporte etc. e nem os governadores nem
ninguém desses governos se deu conta.
E o pior é que a
tentativa de convencer o povo brasileiro de que só o PT tem problemas de
corrupção ameaça institucionalizar no país esse esquema criminoso que
envolve Imprensa, Legislativo, Executivo, Judiciário e o Ministério
Público do Brasil. Tempos sombrios se avizinham para este país. Sob a
versão de combate à corrupção, ela está sendo institucionalizada